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Original Article - Year2009 - Volume24 - Issue 1

ABSTRACT

Introduction: The lid scar retraction constitutes usual complication of the postoperative lower lid blepharoplasty. Objective: This article discusses the importance of the systematic association of the lateral canthopexy in lower lid blepharoplasty to reduce its incidence. Method: In this retrospective study, 200 patients were assigned to the transcutaneous or transconjunctival lower lid blepharoplasty linked or not to the Lessa's lateral canthopexy, with a follow-up of 12 months. Results: The patients group submitted to lower lid blepharoplasty with lateral canthopexy had 1% of scar retraction against 16% in the isolated lower lid blepharoplasty group. Discussion: The systematic indication of the lateral canthopexy in association with lower lid blepharoplasty brings different opinions of many authors. For its easy execution, low morbidity and confirmed effectiveness in the prevention of the scleral show, rounding of the lateral canthus and ectropion post lower lid blepharoplasty, the authors conclude that the lateral canthopexy must constitute primary procedure in lower lid blepharoplasty surgery.

Keywords: Blepharoplasty. Eyelids/surgery. Ectropion prevention & control.

RESUMO

Introdução: A retração cicatricial da pálpebra constitui complicação comum do pós-operatório de blefaroplastia inferior. Objetivo: Neste artigo, discute-se a importância de associar sistematicamente a cantopexia lateral à blefaroplastia inferior para reduzir sua incidência. Método: Estudo retrospectivo de 200 pacientes submetidos a blefaroplastia inferior transcutânea ou transconjuntival associada ou não à cantopexia lateral proposta por Lessa, com seguimento de 12 meses. Resultados: No grupo de pacientes submetidos a blefaroplastia inferior com cantopexia lateral observou-se índice de 1% de retração cicatricial, contrastando com 16% dessa complicação no grupo que realizou a blefaroplastia inferior isolada. Discussão: A indicação sistemática da cantopexia lateral associada à blefaroplastia inferior divide as opiniões de diversos autores. Por sua fácil execução, baixa morbidade e eficácia comprovada na prevenção da esclera aparente, do arredondamento do canto lateral do olho e do ectrópio pós-blefaroplastia inferior, os autores defendem a opinião de que a cantopexia lateral deve constituir procedimento primário em cirurgia de blefaroplastia inferior.

Palavras-chave: Blefaroplastia. Pálpebras/cirurgia. Ectrópio/prevenção & controle.


INTRODUÇÃO

A cantopexia lateral empregada inicialmente em procedimentos reconstrutivos passou, a partir de 1983 com Mc Cord1, a ser utilizada na blefaroplastia estética.

Vários trabalhos mostram a alta incidência de complicações por retração cicatricial da pálpebra pós-blefaroplastia inferior. A desinervação parcial do músculo orbicular do olho durante a blefaroplastia transcutânea é apontada como provável fator desencadeante do mau posicionamento palpebral inferior2. Por evitar o manuseio do músculo orbicular, a blefaroplastia inferior transconjuntival ganhou novo impulso, pela perspectiva de reduzir essas complicações. Entretanto, a retração cicatricial permanece sendo observada como evento adverso desse procedimento3.

Neste trabalho, é discutida a importância da associação primária da cantopexia lateral à blefaroplastia inferior na prevenção dessas complicações.


MÉTODO

Duzentos pacientes foram submetidos a blefaroplastia inferior no período compreendido entre 1995 e 2005. Houve nítido predomínio do sexo feminino (88%) e a idade média foi de aproximadamente 53 + 20 anos.

Foram realizadas 180 (90%) blefaroplastias transcutâneas, com associação da cantopexia lateral de Lessa em 70 (39%) desses procedimentos. Todas as 20 (10%) blefaroplastias transconjuntivais realizadas foram associadas à cantopexia lateral. Os resultados foram analisados por avaliação qualitativa de fotografias padronizadas adquiridas no pré-operatório e com 12 meses de pós-operatório.

Técnica cirúrgica

A cantopexia lateral foi executada conforme a técnica descrita por Lessa et al.1. Após a blefaroplastia superior clássica, realiza-se uma incisão de 10 mm no músculo orbicular ao nível do rebordo súpero-lateral da órbita, para acesso ao periósteo e posterior fixação do canto palpebral lateral. Após blefaroplastia inferior transconjuntival retro-septal, realiza-se uma incisão cutânea subciliar de 2 mm na extremidade palpebral lateral (desnecessária no procedimento transcutâneo) para acessar a placa tarsal. Transfixa-se um fio de nylon 5-0 através da incisão previamente realizada na musculatura orbicular da pálpebra superior, englobando o ligamento cantal lateral superficial2 e um segmento lateral da placa tarsal inferior. Retorna-se com o fio para o ponto de entrada no rebordo orbitário súpero-lateral, suturando-o ao periósteo.

É muito importante que a tração para elevar o canto lateral siga a curvatura da pálpebra inferior, evitando o afastamento da borda palpebral do globo ocular (Figura 1). Cerca de um a dois milímetros do limbo inferior devem ficar encobertos pela borda palpebral. Também se deve estar atento para não englobar a expansão lateral do músculo elevador da pálpebra na sutura, levando a um quadro de ptose. Na blefaroplastia inferior transcutânea, marca-se a incisão do prolongamento lateral da pálpebra dois milímetros mais ascendentes, prevenindo a verticalização da mesma após a cantopexia (Figura 2). Após a cantopexia pode ser necessária a ressecção do excesso cutâneo palpebral inferior.


Figura 1 - A: Sentido correto da tração e localização da cantopexia lateral. B: Fio de nylon englobando a placa tarsal e ligamento cantal lateral superficial, porém sem a tração. C: Tração realizada acompanhando a curvatura natural da pálpebra inferior.


Figura 2 - A: cantopexia tende a verticalizar o prolongamento lateral da incisão subciliar.



As suturas da cantopexia lateral e da pele foram realizadas com fio de nylon monofilamentar 5-0. Compressas geladas foram utilizadas nos três primeiros dias de pós-operatório, durante 20 minutos, com intervalo de 1 hora. A sutura cutânea foi retirada no quinto dia pós-operatório e não houve cobertura antibiótica de qualquer natureza.


RESULTADOS

A avaliação qualitativa das fotografias do pré-operatório e do pós-operatório (Figuras 3 a 6) permitiu verificar as principais alterações palpebrais encontradas nesses dois momentos.


Figura 3 - Paciente de 86 anos, com flacidez palpebral, bolsas gordurosas e dermatocalase. A,C e E: Pré-operatório. B, D e F: Pós-operatório de 12 meses de blefaroplastia transcutânea + cantopexia lateral.


Figura 4 - Paciente de 52 anos com dermatocalase e bolsas gordurosas. A, C e E: Pré-operatório. B, D e F: Pós-operatório de 12 meses de blefaroplastia transcutânea + cantopexia lateral.


Figura 5 - Paciente de 48 anos com flacidez palpebral, bolsas gordurosas e dermatocalase. A, C e E: Pré-operatório. B, D e F: Pós-operatório de 12 meses de blefaroplastia transcutânea + cantopexia lateral.


Figura 6 - Paciente de 46 anos com dermatocalase e bolsas gordurosas. A, C e E: Pré-operatório. B, D e F: Pós-operatório de 12 meses de blefaroplastia transconjuntival + cantopexia lateral.



As alterações palpebrais mais frequentes na avaliação pré-operatória compreendem excesso de pele, flacidez palpebral e presença de bolsas adiposas.

O porcentual das complicações após os procedimentos de blefaroplastia inferior, tanto transcutânea quanto transconjuntival, associada ou não à cantopexia lateral, pode ser visualizado na Tabela 1. Houve predominância de retrações palpebrais nas blefaroplastias inferiores sem cantopexia lateral. Ectrópio palpebral permanente, uma das complicações mais graves, foi raro nas blefaroplastias sem cantopexia e ausente nas blefaroplastias associadas à cantopexia lateral.




DISCUSSÃO

O mau posicionamento palpebral é uma das complicações mais conhecidas da blefaroplastia inferior. A esclera aparente, o arredondamento do canto palpebral lateral e o redimensionamento das fendas palpebrais são algumas das alterações anatômicas decorrentes da retração cicatricial da pálpebra passíveis de serem encontradas no pós-operatório da blefaroplastia inferior. Alterações preexistentes, como flacidez palpebral, vetor negativo do terço médio da face e proptose, contribuem no surgimento dessas complicações4.

Nos jovens, o posicionamento normal do canto lateral é cerca de um a dois milímetros mais alto que o canto medial5 (Figura 7). A flacidez palpebral inferior e as alterações no mecanismo de suporte da pálpebra, incluindo o ligamento cantal lateral, são achados típicos do processo de envelhecimento.


Figura 7 - Nos jovens, o canto lateral situa-se cerca de 2 mm mais alto que o canto medial.



Várias alternativas cirúrgicas são descritas na literatura objetivando minimizar os efeitos deletérios da blefaroplastia inferior no posicionamento palpebral. Hwang et al.6, após estudos anatômicos dos ramos nervosos do músculo orbicular do olho realizados em cadáveres, e baseados em experiência clínica, recomendam evitar uma "zona crítica" de 0,5 cm de raio, localizada 2,5 cm ínfero-lateralmente ao canto lateral (ramos do nervo zigomático) para evitar ectrópio palpebral. Lowe et al.4 mostraram, também após estudos anatômicos, a distribuição sem dominância de ramos nervosos para o músculo orbicular do olho, medial e lateral ao limbo lateral, relatando poucas complicações no pós-operatório imediato e tardio da blefaroplastia inferior transcutânea quando o músculo orbicular é preservado em sua porção medial. Seus estudos sugerem que os múltiplos ramos nervosos para a musculatura palpebral inferior proporcionam um grande potencial de reinervação a longo prazo dos segmentos desinervados da porção pré-tarsal do orbicular. Byrd2, por outro lado, baseado em sua experiência clínica, acredita que os ramos nervosos terminais laterais são divididos com a incisão subciliar transorbicular, contribuindo para a perda do tônus muscular da faixa pré-tarsal, sendo este o fator fundamental para o desenvolvimento da esclera aparente e do lagoftalmo após a blefaroplastia, com consequente necessidade de cantoplastia lateral. DiFrancesco et al.7, por meio da avaliação pré e pós-operatória de blefaroplastias inferiores transcutâneas, utilizando achados eletromiográficos e videográficos, concluem que o mau posicionamento ou a função anormal da pálpebra inferior pós-blefaroplastia transcutânea não podem ser atribuídos à desinervação dos ramos do zigomático do nervo facial, pois em 94% dos pacientes estudados o vídeo evidenciava mau posicionamento palpebral inferior, porém não havia evidência de desinervação aguda na eletroneuromiografia.

Na tentativa de preservar a inervação do músculo orbicular do olho, a blefaroplastia inferior transconjuntival para tratamento das bolsas gordurosas tem sido utilizada com frequência, com menor número de complicações por retração cicatricial3,8-11. As cantopexias laterais são utilizadas de forma sistemática5,12 ou casual2,8-11 nas blefaroplastias inferiores para corrigir a flacidez palpebral inferior e reposicionar o canto lateral da pálpebra.

Flowers e Nassif5 classificam as cantopexias laterais em cantopexia periosteal simples, cantopexia periosteal com liberação do ligamento cantal lateral, cantopexia periosteal associada a uma segunda camada com retalho muscular do orbicular e cantopexia óssea. A maioria dessas técnicas usa desinserção do ligamento cantal lateral13, retalho do músculo orbicular14, retalho dermomuscular ou retalho tarsoconjuntival. Já a cantopexia lateral proposta por Lessa et al.1 evita a desinserção do ligamento cantal lateral e dissecção de túnel submuscular, sendo por isso de fácil execução e de pouca morbidade.

O entendimento da cantopexia lateral simples de Lessa ficou mais claro com o trabalho publicado por Knize15, em 2001, quando demonstrou em cadáveres que, além do mecanismo de suporte lateral da pálpebra já conhecido como retináculo lateral, existe uma estrutura em continuidade com a fáscia temporal superficial, o septo orbitário e a placa tarsal, situado superficialmente ao tendão lateral, que exerce importante papel no suporte palpebral lateral, denominando-o de tendão cantal lateral superficial (Figura 8).


Figura 8 - A: Dissecção do tendão cantal lateral superficial. B: Tendão cantal lateral e tendão cantal lateral superficial de Knize (seta e pinça).



Atualmente, emprega-se rotineiramente a cantopexia lateral de Lessa em todas as blefaroplastias transcutâneas e transconjuntivais, para reposicionar o canto palpebral lateral, tornando a pálpebra com aspecto mais jovial; tensionar a cinta septomiocutânea palpebral inferior, prevenindo a esclera aparente e o arredondamento do canto palpebral lateral.

A cantopexia lateral diminui ou, por vezes, dispensa a necessidade de ressecção da pele palpebral inferior, sobretudo nos pacientes com flacidez leve.


CONCLUSÃO

Os resultados indicaram que a associação sistemática da cantopexia lateral à blefaroplastia inferior promove significativa redução das complicações decorrentes da retração cicatricial da pálpebra inferior.


REFERÊNCIAS

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2. Byrd HS. Analysis of the nerve branches to the orbicularis oculi muscle of the lower eyelid in fresh cadavers. Plast Reconstr Surg. 2005;116(6):1750-1.

3. Graf R, Auerswald A, Bernardes A, Damásio RC, Araújo LRR, Graf CM. Blefaroplastia inferior transconjuntival. Rev Soc Bras Cir Plást. 2001;16(2):67.

4. Lowe JB, Cohen M, Hunter DA, Mackinnon SE. Analysis of the nerve branches to the orbicularis oculi muscle of the lower eyelid in fresh cadavers. Plast Reconstr Surg. 2005;116(6):1743-9.

5. Flowers RS, Nassif JM. Aesthetic periorbital surgery. In: Mathes SJ, ed. Plastic surgery. Califórnia: Saunders; 2006. p.77-126.

6. Hwang K, Lee DK, Lee EJ, Chung IH, Lee SI. Innervation of the lower eyelid in relation to blepharoplasty and midfacelift: clinical observation and cadaveric study. Ann Plast Surg. 2001;47(1):1-5.

7. DiFrancesco LM, Anjema CM, Codner MA, McCord CD, English J. Evaluation of conventional subciliary incision used in blepharoplasty: preoperative and postoperative videography and electromyography findings. Plast Reconstr Surg. 2005;116(2):632-9.

8. Aboudib JH. Fórum: Blefaroplastia inferior. Rev Soc Bras Cir Plást. 2001;16(1):11-6.

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14. Abramo AC, Dorta AA, Ribeiro VO, Teixeira JC, Galindo RG. Retalho biplanar para blefaroplastia inferior. Rev Soc Bras Cir Plást. 2001;16(3):12-6.

15. Knize DM. The forehead and temporal fossa. Philadelphia:Lippincott Williams & Wilkins;2001.








I. Membro Titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica. Chefe de Clínica do Serviço de Cirurgia Plástica e Microcirurgia Reconstrutiva do Hospital Universitário Walter Cantídio da Universidade Federal do Ceará.
II. Membro Titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica. Regente do Serviço de Cirurgia Plástica e Microcirurgia Reconstrutiva do Hospital Universitário Walter Cantídio da Universidade Federal do Ceará. São Lucas - Hospital de Cirurgia e Anestesia.
III. Membro Associado da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica. Preceptor do Serviço de Cirurgia Plástica e Microcirurgia Reconstrutiva do Hospital Universitário Walter Cantídio da Universidade Federal do Ceará. São Lucas - Hospital de Cirurgia e Anestesia.
IV. Membro Associado da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica. Otorrinolaringologista do Hospital Universitário Walter Cantídio da Universidade Federal do Ceará.
V. Médico Residente do Serviço de Cirurgia Plástica e Microcirurgia Reconstrutiva, Credenciado pela SBCP e MEC, Hospital Universitário Walter Cantídio da Universidade Federal do Ceará.

Correspondência para:
Nelson Simas
Rua Monsenhor Catão, 1070, apto 500 - Aldeota
Fortaleza, CE, Brasil - CEP 60175-000
E-mail: nelsonsimas@yahoo.com.br

Trabalho realizado no Hospital Universitário Walter Cantídio da Universidade Federal do Ceará, Serviço de Cirurgia Plástica e Microcirurgia Reconstrutiva e no Hospital Otoclínica, Fortaleza, CE.

Artigo recebido: 23/1/2009
Artigo aceito: 2/3/2009

 

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