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Original Article - Year2013 - Volume28 - Issue 3

RESUMO

INTRODUÇÃO:Adescoberta do câncer de mama, aliada à mastectomia, impacta negativamente no estado emocional da paciente, cujo efeito psicossocial é uma distorção da imagem corporal, com piora na feminilidade, sexualidade e qualidade de vida. A reconstrução mamária pode ser realizada em diferentes tempos e por meio de diversas técnicas, trazendo conforto e melhora da qualidade de vida dessas pacientes.
MÉTODO: Foi realizado estudo retrospectivo de 16 pacientes do gênero feminino submetidas a reconstrução de mama no período entre outubro de 2008 e outubro de 2011. Foram observados os seguintes parâmetros: idade, presença de complicações, técnicas, tempo de reconstrução, terapias adjuvantes (quimioterapia e radioterapia) e grau de satisfação com a reconstrução. Os dados foram levantados por meio de revisão de prontuário e da satisfação das pacientes com o procedimento mensurada por questionário específico.
RESULTADOS: As pacientes muito satisfeitas representaram 93,75% dos casos (15 pacientes) e as 6,25% restantes (1 paciente) apresentaram-se pouco satisfeitas. Nenhuma paciente relatou insatisfação após a reconstrução. A paciente que relatou estar pouco satisfeita ainda não concluiu todos os estágios da reconstrução mamária.
CONCLUSÕES: Apesar da pequena amostra de pacientes, a reconstrução impacta positivamente na qualidade de vida das pacientes submetidas a mastectomia, independentemente da técnica e do tempo escolhido para essa reconstrução, trazendo elevado grau de satisfação com a alteração do contorno corporal.

Palavras-chave: Neoplasias da mama. Mastectomia. Mamoplastia. Dispositivos para expansão de tecidos. Retalho miocutâneo.

ABSTRACT

BACKGROUND: Detection of breast cancer coupled with mastectomy negatively affects patients' emotional state. The psychosocial effect is a distortion of body image, including decreased femininity, sexuality, and quality of life. Breast reconstruction can be performed at different times using different techniques, improving the comfort and quality of life of these patients.
METHOD: This was a retrospective study of 16 female patients who underwent breast reconstruction between October 2008 and October 2011. The following parameters were analyzed: age, complications, techniques, time of reconstruction, adjuvant therapies (i.e., chemotherapy and radiotherapy), and satisfaction with reconstruction. Data were collected through chart reviews, and patient satisfaction with the procedure was measured using a specific questionnaire.
RESULTS: Among the 16 patients, 15 (93.75%) reported being very satisfied, and the remaining 1 patient (6.25%) was somewhat satisfied; no patient reported dissatisfaction after reconstruction; the 1 patient who reported being somewhat dissatisfied had not completed all stages of breast reconstruction.
CONCLUSIONS: Despite the small sample size, the results indicate that reconstruction positively affected the quality of life of patients undergoing mastectomy, regardless of the technique or time chosen for reconstruction, resulting in a high degree of satisfaction with a change in body contouring.

Keywords: Breast neoplasms. Mastectomy. Mammaplasty. Tissue expansion devices. Myocutaneous flap.


INTRODUÇÃO

O câncer de mama representa a neoplasia mais comum no sexo feminino e é a principal causa de morte por câncer entre as mulheres atualmente. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), ocorrem mais de 1.050.000 novos casos por ano em todo o mundo. Desde 1990, tem-se observado em países desenvolvidos como Estados Unidos, Canadá e Reino Unido, entre outros, aumento da incidência desse tipo de câncer, associado a redução da mortalidade, fato este relacionado à detecção precoce por meio de programas de rastreamento adequados. Apesar disso, em países em desenvolvimento, como o Brasil, observou-se aumento da taxa de mortalidade aliado à incidência, o que tem sido justificado por um retardo do diagnóstico e da instituição da terapêutica adequada1,2.

O tratamento do câncer de mama vai depender diretamente do estadiamento clínico e do tipo histológico, sendo a abordagem cirúrgica o pilar principal desse tratamento, podendo ser acompanhada de linfadenectomia axilar e de terapias adjuvantes (quimioterapia e radioterapia). O tratamento cirúrgico inclui modalidades conservadoras, como a quadrantectomia e a mastectomia poupadora de pele, e outras não conservadoras, representadas principalmente pela mastectomia radical modificada3.

Tanto o tempo em que é realizada a reconstrução como a técnica utilizada devem ser individualizados e variam conforme idade, estadiamento, proposta de tratamento oncológico, biotipo da paciente e preferências da paciente e do cirurgião4,5.

A técnica escolhida para a reconstrução deve ser discutida com a paciente, expondo suas vantagens e desvantagens. Dentre as opções, as mais utilizadas são as reconstruções com tecido autólogo, seja por meio de retalhos miocutâneos ou microcirúrgicos, e as utilizando material aloplástico.

Comumente, 3 técnicas consagradas são discutidas pelos estudiosos: o retalho transverso do músculo reto abdominal (TRAM), o retalho do músculo grande dorsal e a reconstrução com material aloplástico (expansores ou implantes). Todos os 3 métodos costumam dar bons resultados e baixo índice de reoperação, quando a escolha segue os critérios supracitados e debatidos com a paciente5.

Segundo Ananthakrishnan & Lucas6, o principal fator que influencia na escolha do tempo da reconstrução é a necessidade de radioterapia. Pacientes com indicação confirmada ou com suspeita de que serão submetidas a radioterapia no período pós-operatório se beneficiam mais da reconstrução tardia, em decorrência do aumento do índice de complicações, como contratura capsular e extrusão, quando utilizado material aloplástico, e redução do volume com retração do retalho, quando empregado tecido autólogo6,7.

Assim, a reconstrução mamária constitui um capítulo na vida dessas pacientes, que têm que conviver com o diagnóstico do câncer de mama, que, por si só, já traz consequências para a esfera psicossocial, além de serem submetidas a um procedimento de caráter mutilante, como a mastectomia. Nesse cenário traumático, aumentar a sobrevida não é a única finalidade do tratamento, pois a reconstrução de mama ajuda a paciente a resgatar sua imagem corporal, melhorando a vitalidade, a feminilidade e a sexualidade, bem como seu bem-estar e sua qualidade de vida8.


MÉTODO

Foi realizado um estudo retrospectivo, realizado em um centro único, no período compreendido entre outubro de 2008 e outubro de 2011.

O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa da Instituição.

Foram selecionadas 16 pacientes do sexo feminino, com idade entre 30 anos e 55 anos, submetidas a mastectomia radical modificada e reconstruídas no período mencionado. Todas as pacientes apresentavam carcinoma ductal infiltrante, das quais 8 (50%) foram diagnosticadas com câncer na mama direita e 8 (50%), na mama esquerda.

As pacientes tiveram suas mamas reconstruídas utilizando as técnicas de TRAM, retalho do músculo grande dorsal associado à inclusão de implante de silicone e inclusão de expansores com posterior substituição por implantes de silicone, sendo 14 (87,5%) reconstruídas tardiamente e 2 (12,5%), submetidas a reconstrução imediata.

Todas as pacientes submetidas a reconstrução mamária com retalho TRAM foram operadas pela técnica monopediculada com o músculo reto abdominal contralateral, com fechamento do defeito da parede abdominal utilizando tela de Marlex® (Figura 1).


Figura 1 - Aspecto intraoperatório de reconstrução com retalho TRAM monopediculado, revelando retalho dissecado e pronto para ser rodado.



As pacientes submetidas a reconstrução mamária com retalho do músculo grande dorsal tiveram sua área doadora fechada com pontos de adesão e com drenagem a vácuo, utilizando implantes de silicone texturizados (Figuras 2 a 4).


Figura 2 - Marcação pré-operatória do retalho do músculo grande dorsal.


Figura 3 - Retalho do músculo grande dorsal dissecado.


Figura 4 - Pontos de adesão na área doadora.



As reconstruções utilizando expansor foram realizadas através de uma loja criada com o músculo peitoral maior serrátil anterior. O tamanho de expansor usado em todas as pacientes desse grupo foi de 500 ml. A expansão teve início após 1 mês da inclusão, sendo a troca pelo implante correspondente programada para 2 semanas após a última expansão.

A escolha da técnica foi realizada obedecendo aos seguintes critérios: biotipo, radioterapia, comorbidades e desejo da paciente. Assim, pacientes com abdome doador, pouca ou nenhuma comorbidade e com desejo de reconstrução com emprego do retalho TRAM, após orientadas sobre pós e contras da técnica, foram operadas. Pacientes sem abdome doador, que não desejavam reconstrução com utilização do músculo reto abdominal ou com 2 ou mais comorbidades foram selecionadas para reconstrução mamária com o músculo grande dorsal ou com expansor, dependendo da presença de radioterapia ou não, respectivamente.

Avaliação do Grau de Satisfação

Um ano após o primeiro tempo da reconstrução mamária, as pacientes foram avaliadas quanto à presença de complicações no pós-operatório e ao grau de satisfação pós-reconstrução, sendo esse grau mensurado como muito satisfeita, pouco satisfeita ou insatisfeita. O conceito de satisfação orientado às pacientes durante o questionário foi direcionado no sentido do bem-estar físico e psicossocial.


RESULTADOS

Dentre todas as pacientes submetidas a reconstrução mamária incluídas neste estudo, em 10 (62,5%) foi empregado o retalho TRAM, em 2 (12,5%), o músculo grande dorsal com implante de silicone, e em 4 (25%) foi realizado procedimento de inclusão de expansor cutâneo de mama, com posterior substituição por implante definitivo (Figura 5).


Figura 5 - Técnicas utilizadas para reconstrução mamária. GD = músculo grande dorsal; TRAM = retalho transverso do músculo reto abdominal.



O índice de massa corporal das pacientes variou entre 17,7 e 34,7, com média de 25,2. Tabagismo foi relatado por apenas 1 (6,25%) paciente.

Em relação às comorbidades, 3 (18,75%) pacientes eram portadoras de hipertensão arterial sistêmica (HAS) e 1 (6,25%), de diabetes melito. Todas essas pacientes apresentavam controle medicamentoso da comorbidade no período da reconstrução mamária.

Das 16 pacientes, 15 (93,75%) foram submetidas a segundo tempo da reconstrução mamária, representado em sua maioria (87,5%) por simetrização da mama contralateral. O terceiro tempo foi realizado por 31,25% das pacientes, representado pela reconstrução do complexo areolopapilar (CAP).

Foram observadas 10 complicações em todo o grupo estudado, divididas em recentes e tardias, de acordo com o período em que foram observadas (recentes até o 30º dia de pós-opératório e tardias, após esse período). A Figura 6 apresenta as principais complicações observadas nesse grupo de pacientes.


Figura 6 - Complicações.



A maior proporção (80%) dessas complicações foi encontrada nas pacientes submetidas a reconstrução com retalho TRAM. O hematoma foi constatado no 7º dia de pós-operatório, localizado no abdome, e resultou em reintervenção cirúrgica, com tratamento adequado. Essa paciente era portadora de HAS, controlada na época com medicação anti-hipertensiva. A necrose foi parcial e passível de ressecção com rafia primária. As complicações relacionadas à esteatonecrose foram tratadas com ressecção do tecido no tempo cirúrgico subsequente. As outras 2 complicações que resultaram em queixa quanto à cicatriz (cicatriz inestética) foram observadas nas pacientes submetidas a reconstrução com o músculo grande dorsal. Nenhuma das complicações interferiu no resultado final após o tratamento.

Em relação ao grau de satisfação, 93,75% das pacientes mostraram-se muito satisfeitas com o resultado pós-operatório, referindo melhora da qualidade de vida e maior interação com seu meio social. Em 6,25% dos casos as pacientes manifestaram-se pouco satisfeitas e nesse grupo, representado por uma única paciente, a satisfação parcial foi esclarecida como decorrente de não finalização da reconstrução, estando essa paciente no grupo que não reconstruiu o CAP.

As Figuras 7 a 13 ilustram alguns casos da presente casuística.


Figura 7 - Em A, aspecto pré-operatório de reconstrução com retalho TRAM. Em B, aspecto pós-operatório de reconstrução com retalho TRAM.


Figura 8 - Em A, aspecto pré-operatório de reconstrução com retalho TRAM. Em B, aspecto pós-operatório de reconstrução com retalho TRAM.


Figura 9 - Em A, aspecto pré-operatório de reconstrução com retalho TRAM. Em B, aspecto pós-operatório de reconstrução com retalho TRAM.


Figura 10 - Em A, aspecto pré-operatório de reconstrução com retalho TRAM. Em B, aspecto pós-operatório de reconstrução com retalho TRAM.


Figura 11 - Em A, aspecto pré-operatório de reconstrução com retalho TRAM. Em B, aspecto pós-operatório de reconstrução com retalho TRAM.


Figura 12 - Em A, aspecto pré-operatório de reconstrução com retalho do músculo grande dorsal e simetrização com implante. Em B, aspecto pós-operatório de reconstrução com retalho do músculo grande dorsal e simetrização com implante.


Figura 13 - Em A, aspecto pré-operatório de reconstrução com retalho do músculo grande dorsal e simetrização com implante. Em B, aspecto pós-operatório de reconstrução com retalho do músculo grande dorsal e simetrização com implante.



DISCUSSÃO

A reconstrução de mama resgata a autoestima, a feminilidade e a sexualidade das pacientes submetidas a mastectomia, minimizando danos psicossociais e traumas relacionados à imagem corporal. Apesar de muitas técnicas serem aplicadas, neste artigo é apresentado um estudo envolvendo reconstrução com TRAM, retalho do músculo grande dorsal com implante e através da utilização de expansores cutâneos, com posterior troca por implantes de silicone.

As 3 técnicas utilizadas são consagradas e comparadas em muitos estudos sobre o grau de satisfação após a reconstrução da mama. Kalaaji & Bruheim9 não verificaram diferenças relacionadas à melhora da qualidade de vida na comparação dessas 3 técnicas, e a maioria das pacientes recomendava a cirurgia a que havia sido submetida ao final do tratamento.

Craft et al.10 encontraram taxas semelhantes de complicação entre reconstruções unilaterais e bilaterais, porém nas reconstruções unilaterais o maior índice de satisfação foi utilizando retalho autólogo, enquanto nas bilaterais os índices de satisfação entre as 3 técnicas foram semelhantes.

O objetivo deste estudo não foi comparar resultados, qualidade da reconstrução ou índice de complicações envolvendo as técnicas utilizadas, uma vez que apresenta número reduzido de pacientes, mas sim verificar a importância da reconstrução de mama e seu efeito benevolente sobre a percepção corporal, causando impacto positivo na qualidade de vida e reintegrando socialmente essas pacientes.


CONCLUSÕES

Apesar da casuística pequena deste estudo, pudemos concluir que ele está de acordo com a maioria dos trabalhos relacionados, em que 93,75% das pacientes questionadas se mostraram muito satisfeitas com o resultado e 6,25% se apresentaram pouco satisfeitas, independentemente da técnica utilizada. Também não foram encontradas complicações graves relacionadas ao ato da reconstrução e seu número encontra-se de acordo com a literatura.


REFERÊNCIAS

1. Brasil. Instituto Nacional do Câncer. Controle do câncer de mama: documento de consenso. Rio de Janeiro: INCA; 2004.

2. Brasil. Instituto Nacional do Câncer. Detecção precoce do câncer de mama. Rio de Janeiro: INCA; 2011.

3. Zurrida S, Bassi F, Arnone P, Martella S, Del Castillo A, Ribeiro Martini R, et al. The changing face of mastectomy (from mutilation to aid to breast reconstruction). Int J Surg Oncol. 2011;2011:980158.

4. Djohan R, Gage E, Bernard S. Breast reconstruction options following mastectomy. Cleve Clin J Med. 2008;75 Suppl 1:S17-23.

5. Andjelkov K, Sforza M, Granic M, Ivanov D, Colic M. Breast reconstruction: correlation between different procedures, reconstruction timing and complications. Srp Arh Celok Lek. 2011;139(7-8):470-5.

6. Ananthakrishnan P, Lucas A. Options and considerations in the timing of breast reconstruction after mastectomy. Cleve Clin J Med. 2008;75 Suppl 1:S30-3.

7. Veronesi P, Ballardini B, De Lorenzi F, Magnoni F, Lissidini G, Caldarella P, et al. Immediate breast reconstruction after mastectomy. Breast. 2011;20 Suppl 3:S104-7.

8. Cordeiro PG. Breast reconstruction after surgery for breast cancer. N Engl J Med. 2008;359(15):1590-601.

9. Kalaaji A, Bruheim M. Quality of life after breast reconstruction: comparison of three methods. Scand J Plast Reconstr Surg Hand Surg. 2010;44(3):140-5.

10. Craft RO, Colakoglu S, Curtis MS, Yueh JH, Lee BS, Tobias AM, et al. Patient satisfaction in unilateral and bilateral breast reconstruction. Plast Reconstr Surg. 2011;127(4):1417-24.










Membro titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, cirurgião plástico pela Santa Casa de Misericórdia de Vitória, Vitória, ES, Brasil

Correspondência para:
Felipe Gama e Colombo
Rua Des. Carlos Xavier Paes Barreto, 35 - ap. 801 - Mata da Praia
Vitória, ES, Brasil - CEP 29065-330
E-mail: fgcol@hotmail.com

Artigo submetido pelo SGP (Sistema de Gestão de Publicações) da RBCP.
Artigo recebido: 24/7/2012
Artigo aceito: 4/2/2013

Trabalho realizado na Santa Casa de Misericórdia de Vitória, Vitória, ES, Brasil.

 

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