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Original Article - Year2013 - Volume28 - Issue 4

http://www.dx.doi.org/ 10.5935/2177-1235.2013RBCP0578

RESUMO

INTRODUÇÃO: Orelha em abano representa a deformidade congênita mais comum da orelha externa, é transmitida de forma autossômica dominante e afeta aproximadamente 5% da população em geral. Existem três vias principais para a realização da otoplastia moderna: a raspagem, excisão e fixação por pontos da cartilagem auricular. A abordagem de Mustardé, em 1963, para a criação de uma nova anti-hélice era baseada em suturas permanentes por acesso posterior e os pontos englobavam até o pericôndrio anterior, sem transfixar a pele. Furnas (1968) realizava sutura com fio inabsorvível posicionado na cartilagem conchal, transfixando até pericôndrio anterior e suturado na fáscia mastoide. A otoplastia pode ser realizada com anestesia local associada ou não à sedação ou com anestesia geral.
OBJETIVO O presente estudo tem como objetivo avaliar a intensidade da dor dos pacientes submetidos à otoplastia sob anestesia local com sedação e sem sedação, comparando as duas técnicas anestésicas.
MÉTODO: Foram separados dois grupos: Grupo 1 - 12 pacientes operados com anestesia local e sedação no centro cirúrgico; Grupo 2 - 26 pacientes operados com anestesia local e sem sedação no ambulatório de pequenas cirurgias. O estudo foi realizado no período de 1 ano (maio de 2011 a maio de 2012). Foi realizado um questionário com esses pacientes para avaliarmos o nível de dor no intraoperatório e pós-operatório.
RESULTADOS: Não houve diferença estatisticamente significativa entre os dois grupos.
CONCLUSÃO: É possível realizarmos essa cirurgia com menor custo hospitalar e utilizarmos as salas do centro cirúrgico com anestesista para cirurgias mais complexas.

Palavras-chave: Orelha/Cirurgia. Anestesia. Sedação Consciente.

ABSTRACT

INTRODUCTION: Ear flappy is a congenital deformity most common of external ear, is transmitted by dominant form and occurs in 5% of general population. There are three main ways to do the modern surgery: the shaving, exision and fixation for stitchs of ear gristle. The technique of Mestardé, in 1963, do a new antihelice was supported in permanent sutures for posterior way and the stitchs takes until anterior perichondrium, without takes the skin. Furnas (1968) done suture with unabsorbed thread in conchal gristle, transfixing until anterior perichondrium and sutures in mastoid fascia. The otoplasty can be done with local anesthesia associated or not with sedation or with general anesthesia. The aim of the study is to evaluate the intensity of pain of patients submited to otoplasty with local anesthesia with sedation and without sedation, comparing two techniques.
METHOD: There was separated 2 groups: Group 1: 12 patients operates with local anesthesia and sedation in surgery center; group 2: 26 patients operated with local surgery in clinic of small surgeries. The study was done in one year (2011 to 2012 May). It was done a lot of questions with these patients to evaluate the level of pain during the surgery and post-surgery.
RESULTS: There was not significant diference between two groups.
CONCLUSION: It is possible to do this surgery with less hospital cost and the use the rooms in surgery center for more complex surgeries.

Keywords: Ear/Surgery. Anesthesia. Conscious Sedation.


INTRODUÇÃO

Orelha em abano representa a deformidade congênita mais comum da orelha externa, é transmitida de forma autossômica dominante e afeta aproximadamente 5% da população em geral1. Na literatura, existem mais de 200 procedimentos descritos para tratamento de orelha em abano2,3. Existem três vias principais para a realização da otoplastia moderna: a raspagem, excisão e fixação por pontos da cartilagem auricular4.

As diferentes técnicas de otoplastia vêm se desenvolvendo há muitos anos. Dieffenbach, em 1845, descreveu o primeiro caso de otoplastia pós-trauma. Ele utilizou-se de ressecção de pele pós-auricular e fixação conchomastoide como forma de tratamento5-7. Ely8 descreveu sua técnica em otoplastias eletivas, em 1881, na qual realizava excisão de pele pós-auricular, fixação conchomastoide e excisão de uma faixa de cartilagem conchal. Luckett adicionou a importância da confecção e restauração da forma da anti-hélice no procedimento de otoplastia. Para criar a anti-hélice, ele se utilizava de acesso posterior e realizava ressecção da cartilagem com posterior união das bordas9. Becker10, em 1952, introduziu um conceito para obtenção de uma forma mais suave da anti-hélice e, para isso, utilizava incisões na cartilagem associada a suturas. Esta técnica foi depois revista por Converse & WoodSmith, em 1963. A abordagem de Mustardé11, em 1963, para a criação de uma nova anti-hélice era baseada em suturas permanentes por acesso posterior e os pontos englobavam até o pericôndrio anterior, sem transfixar a pele. Já Stenstrom12 (1963) se utilizava de raspagem anterior para conseguir um contorno mais suave da anti-hélice.

As deformidades da concha podem ser tratadas de várias formas, incluindo excisão, raspagem e fixação da cartilagem. As técnicas com sutura foram inicialmente descritas por Owens & Delgado (1955)13. Seu método, logo após, foi modificado por Furnas14 (1968). Este realizava sutura com fio inabsorvível posicionado na cartilagem conchal, transfixando até pericôndrio anterior e suturado na fáscia mastoide.

A otoplastia pode ser realizada com anestesia local associada ou não à sedação ou com anestesia geral. A inervação da orelha externa acompanha a distribuição dos arcos branquiais, e consiste no ramo anterior e posterior do nervo auricular maior, o qual inerva as estruturas originadas do primeiro arco branquial (trágus e crus da antihélice) e no nervo auriculotemporal, o qual inerva as estruturas originadas do segundo arco branquial (hélice, escafa, anti-hélice, concha, antitrágus, meato acústico externo, e lóbulo). O meato acústico externo também recebe inervação de ramos do nervo vago e glossofaríngeo.


OBJETIVO

O presente estudo tem como objetivo avaliar a intensidade da dor dos pacientes submetidos à otoplastia sob anestesia local com sedação e sem sedação, comparando as duas técnicas anestésicas.


MÉTODO

Entre 2011 e 2012, foi realizado um estudo prospectivo pela equipe de cirurgia plástica do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais com pacientes submetidos à otoplastia com anestesia local com e sem sedação. Os critérios de inclusão foram:

1. Idade entre 14 e 48 anos;
2. Otoplastia primária;
3. Risco cirúrgico classificado em ASA 1 e ASA
4. Assinatura do termo de consentimento informado para a operação.

Os pacientes submetidos à otoplastia bilateral foram divididos em dois grupos, de acordo com a anestesia utilizada:

Grupo 1: Anestesia local e sedação, realizada em centro cirúrgico, totalizando 12 pacientes.

Grupo 2: Anestesia local sem sedação, realizada em nível ambulatorial, totalizando 26 pacientes.

A técnica cirúrgica e anestésica foi idêntica nos dois grupos, exceto pela utilização ou não da sedação peroperatória. A operação se iniciou com a degermação de toda a face, couro cabeludo e orelhas dos pacientes com clorexidina, colocados os campos estéreis e fixados os mesmos. Demos sequência com a infiltração local de cada orelha com 5 ml de xilocaína a 2% com vasoconstrictor (1:200.000), sendo a anestesia aplicada inicialmente próxima ao lóbulo e, a seguir, direcionada no sentido cefálico ao redor de toda a orelha, completando 360º. Feita em sequência a infiltração anestésica da concha e da mastoide.

Após a anestesia foi realizada a marcação dos pontos de definição da anti-hélice (3 pontos) e os pontos da concha (2) com azul de metileno. Quando houve a necessidade de retirada de cartilagem conchal, esta também foi marcada com azul de metileno. Todas as otoplastias foram realizadas sob o método de Mustardé modificado por Furnas11,14, com raspagem da cartilagem auricular posterior. Após a cirurgia, todos os pacientes tiveram curativo realizado com gaze moldando o novo formato da orelha, gaze aberta e enfaixamento da cabeça, o qual foi substituído por malha cirúrgica após 24h, sendo orientado o uso da mesma por 2 meses.

Os pacientes foram acompanhados semanalmente no primeiro mês e, posteriormente, com consultas no segundo, terceiro, sexto e décimo segundo mês de pós-operatório. Foi realizada entrevista com os pacientes utilizando um questionário com escala numérica-visual, graduada de zero a dez, sendo zero ausência de dor e dez, a pior dor imaginável, para avaliação da dor durante a operação, nas primeiras 12 horas após a operação e entre 12 e 36 horas após a operação; avaliação do grau de satisfação com o resultado final da cirurgia após 40 dias, e se os mesmos se submeteriam novamente à cirurgia pela mesma técnica anestésica. Os dados foram analisados utilizando o software Epi InfoTM 3.5.3.


RESULTADOS

Não houve complicações anestésicas ou cirúrgicas durante o peroperatório, nem recidivas até o presente momento, sem a necessidade de revisões cirúrgicas. Quanto aos resultados, observamos similaridade entre os dois grupos. A partir da Escala Visual Numérica para avaliação de dor, no intraoperatório a pontuação 0 foi a prevalente, com média de nota de 0,58 (Desvio padrão (Dv)-1,08) no Grupo 1 (anestesia local mais sedação) e 1,50 (Dp-2,61) no Grupo 2 (apenas anestesia local);P=0,38. Quanto à avaliação de dor nas primeiras 12h de pós-operatório, tivemos predomínio da pontuação 5 no Grupo 1 ( média de 5 (Dp-2,95)) e média de 4,69 (Dp-3,25) no Grupo 2;P*=0,86. Já nas primeiras 12h às 36h de pós-operatório, houve grande equilíbrio entre as pontuações, sendo a média de 4,08 (Dp-3,31) no Grupo 1 e média de 2,92 (Dp-2,69) no Grupo 2;P*=0,25.

Em relação às medicações utilizadas no pós-operatório, a grande maioria (60% no Grupo 1 e 65% no Grupo 2) dos pacientes utilizaram analgésicos opióides (tylex), além dos analgésicos comuns (dipirona e paracetamol). Quanto ao grau de satisfação com o resultado final da cirurgia, 68,4% dos pacientes ficaram muito satisfeitos, 23,7% satisfeitos e 7,9% insatisfeitos, considerando todos os pacientes operados. Ao serem perguntados sobre se fariam novamente a cirurgia, os dois grupos tiveram resultados semelhantes: 92% responderam que sim e apenas 8% não fariam novamente a cirurgia.


DISCUSSÃO

Observamos a partir dos resultados evidenciados que, apesar da média de dor do grupo com sedação ter sido menor durante a operação e maior no período pós-operatório, não houve diferença estatisticamente significativa no nível de dor sentido pelos pacientes durante ou após a cirurgia nos grupos selecionados. Observamos, também, que se trata de uma cirurgia praticamente sem dor no intraoperatório e dolorosa no pós-operatório, haja vista as pontuações pela Escala Numérica de dor e a necessidade do uso de analgésicos opioides. Assim como trabalhos já descritos na literatura15, nossos pacientes toleraram bem a anestesia local com baixa morbidade no pós-operatório. Segundo Lancaster et al.16, a anestesia local, quando comparada à anestesia geral, possui menor índice de vômitos no pós-operatório, contribuindo para menor tempo de hospitalização. De acordo com Cregg et al.17, não houve diferença entre a infiltração anestésica local com lidocaína comparado ao bloqueio de nervo regional com bupivacaína quanto à duração e qualidade da analgesia, uso de medicação opioide no pós operatório e nível de náuseas e vômitos.

Quanto à técnica utilizada, existem trabalhos na literatura18 que evidenciam a raspagem anterior da cartilagem como método seguro, e garantindo 94,8% de satisfação. Nossa casuística, com raspagem posterior, garantiu nível de satisfação semelhante (92,1%). Segundo Koch et al.19, o uso da técnica de Mustardé modificada garantiu 91,4% de satisfação pelos pacientes e índice de recorrência em 17% dos pacientes analisados.

A grande maioria dos pacientes (92%) referiu que se submeteriam novamente à cirurgia, mostrando que a mesma é bastante tolerável.

O estudo foi realizado em serviço público com pacientes do SUS. A disponibilidade de anestesista para a realização de sedação em conformidade com as normas de segurança previstas pela SBA20 é limitada, sendo que nem sempre é possível sua presença em todas as salas de cirurgia, especialmente em nível ambulatorial. Em nosso serviço, os pacientes operados em bloco cirúrgico são submetidos à sedação e os operados em nível ambulatorial não o são. Ao realizarmos o trabalho, o objetivo era avaliar se havia grande diferença no nível de dor sentida pelos pacientes com e sem o uso de sedação. Apesar da cirurgia com sedação ser mais confortável para os pacientes, ficamos surpresos pelo resultado no qual, na avaliação dos pacientes, não houve diferença significativa da dor entre os dois grupos. Os resultados mostram que essa cirurgia pode ser realizada em um centro de pequenas cirurgias com baixo nível de dor, menor custo e sem os riscos associados à sedação.


CONCLUSÃO

Concluímos que as otoplastias com anestesia local, pela técnica de Mustardé modificada, podem ser realizadas com ou sem sedação com boa tolerância pelos pacientes. O grau de desconforto foi pequeno e a maioria dos pacientes repetiria a operação com o mesmo tipo de anestesia. A operação em ambas as técnicas anestésicas mostraram ser seguras e produziram bons resultados com ótima percepção de satisfação pelos pacientes.

Este estudo demonstra que a otoplastia pode ser realizada apenas com a anestesia local em nível ambulatorial, dispensando o uso de salas em centros cirúrgicos, de medicações sedativas e internações, com diminuição dos custos para o serviço público.


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20. Sociedade Brasileira de Anestesiologia [Acesso 25 maio 2013]. http://www.sba.com.br/arquivos/estatuto/sba/2012/










1. Especialização. Residente de cirurgia plástica do HC-UFMG
2. Membro Especialista da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica. Preceptor do serviço de cirurgia plástica do HC-UFMG
3. Residente do terceiro ano de cirurgia plástica do HC-UFMG
4. Residente do segundo ano de cirurgia plástica do HC-UFMG
5. Residente do segundo ano de cirurgia plástica do HC-UFMG

Fernanda Zanatta Freitas Santos
Alameda Alvaro Celso, 250/311
CEP: 30150-260 Belo Horizonte, MG, Brasil

Artigo recebido:05/09/2013
Artigo aceito:05/10/2013

Trabalho realizado na Universidade Federal de Minas Gerais. Belo Horizonte, MG, Brasil.

 

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