 
                
                 
                
                Case Reports - Year 1999 - Volume 14 -
                        Cilindromas Múltiplos - Tumor em Turbante - Relato de Caso 
                    
                    Multiple Cylindromas - Turban Tumor Case Report
RESUMO
O "tumor em turbante" corresponde a múltiplos cilindromas em praticamente toda a extensão do couro cabeludo. A doença é benigna, autossômica dominante e tem histogênese controvertida. Descreve-se um caso em homem de 51 anos, do qual, de início, se retiraram alguns tumores; depois se fez exérese ampla de couro cabeludo, seguida de enxerto de pele de coxa. Treze anos depois, o paciente se acha em boas condições, com resultado estético satisfatório.
Palavras-chave: Cilindroma; tumor em turbante; tumor de anexos cutâneos
ABSTRACT
"Turban tumor" corresponds to multiple cylindromas in almost the entire extension of the scalp. The disease is benign, autosomal dominant, and has a controversial histogenesis. A case of a 51 years old man is presented, in which some tumors were initially resected. Then, a large excision of the scalp was acomplished, followed by graft with skin from the thigh. Thirteen years later, the patient is in good conditions, with a satisfactory aesthetic result.
Keywords: Cylindroma; turban tumor; cutaneous appendage tumors.
O cilindroma é uma neoplasia benigna incomum, de anexos cutâneos, que se manifesta freqüentemente como lesão única, pequena, róseo-avermelhada, usualmente indolor, de ocorrência esporádica, situada, em 90% dos casos, no couro cabeludo, na face ou no pescoço. Casos com lesões múltiplas são hereditários, com transmissão autossômica dominante de penetrância incompleta, e se traduzem por nódulos lisos, de contornos arredondados e tamanhos variados, situados no couro cabeludo e, ocasionalmente, na face, mais raramente no tronco e nas extremidades; quando praticamente todo o couro cabeludo é acometido, fala-se em "tumor em turbante"(l,2,3).
Elder et al. (2) afirmam que as lesões do "tumor em turbante" começam a aparecer na idade adulta e, gradativamente, vão aumentando em número e tamanho.
O tratamento preferencial é o cirúrgico, com excisão do couro cabeludo seguida de enxerto livre de pele.
RELATO DO CASO
Homem de 51 anos, leucoderma, lavrador, procurou o Serviço de Cirurgia Plástica da Universidade Federal de Uberlândia, relatando "caroços" dolorosos na cabeça, de aproximadamente 30 anos de evolução, inicialmente pequenos e que aumentaram progressivamente de tamanho. É etilista social e ex-tabagista crônico. Dois tios paternos e o próprio pai tiveram doença semelhante.
Ao exame físico notavam-se dezenas de tumorações de forma e tamanho variados, confluentes, lisas, de consistência firme, cor rósea, com telangiectasias na superfície, localizadas no couro cabeludo e na face (Fig. 1).

Fig. 1 - Múltiplas tumorações em face e couro cabeludo, com tamanhos variados, algumas das quais com telangiectasias em correspondência.
Para os tumores menores e isolados, foi feita excisão com aproximação direta das bordas da ferida cirúrgica, quando possível, ou cobertura com enxerto de pele nos locais de maior extensão. A massa tumoral coalescente foi tratada por ressecção extensa do couro cabeludo, acima da gálea aponeurótica, envolvendo as regiões frontal, temporais e parieto-occipitais (Fig. 2), seguida de enxerto livre de pele na área cruenta resultante. O exame histológico dos tumores revelou cilindromas múltiplos (Fig. 3) e um tricoepitelioma.

Fig. 2 - Segmento de couro cabeludo extirpado mostrando o "tumor em turbante".

Fig. 3 - Cilindroma. Observar lóbulos de células epiteliais pequenas e escuras na periferia e grandes e claras no centro, rodeados por membrana hialina espessa. Notar também pequenas massas de material hialino no interior dos lóbulos. H-E, aumento original de 400 X.
O paciente apresentou boa evolução pós-operatória, com integração total dos enxertos à área receptora. Não foram detectadas intercorrências clínicas importantes. A aparência da cabeça na região do enxerto é esteticamente satisfatória (Figs. 4 e 5).

Fig. 4 - Pós-operatório tardio (13 anos) - Vista frontal.

Fig. 5 - Pós-operatório tardio (13 anos) - Vista posterior.
DISCUSSÃO
O cilindroma incide mais em mulheres e em brancos, iniciando-se mais freqüentemente na terceira ou quarta década(1). Segundo nosso paciente, seus primeiros tumores teriam surgido em torno da idade de 20 anos.
O cilindroma se traduz, histologicamente, por neoplasia epitelial, não encapsulada, constituída por lóbulos de formas e tamanhos variados, localizados na derme superficial e circundados por bainha hialina comumente espessa. As células da periferia dos lóbulos têm núcleos pequenos e escuros e freqüentemente se arranjam em paliçada, as centrais têm núcleos grandes e claros; entre as células podem-se observar glóbulos de material hialino PAS-positivo, diastase-resistente, e estruturas tubulares com material amorfo no lume(2). Dentro do tumor, pode haver áreas com características de espiradenoma écrino, tricoepitelioma e siringoma (l,4). Com certa freqüência, os cilindromas múltiplos se acham associados a tricoepiteliomas (como no presente caso) e espiradenomas écrinos(4). Excepcionalmente, descreve-se sua coexistência com tumor estruturalmente similar em glândula salivar (especialmente na parótida) (2,5).
A histogênese e a diferenciação do tumor são controvertidas. Autores diversos postulam diferenciação écrina, apócrina ou pilar(3). A opinião mais corrente, sobre a histogênese, com base em dados ultra-estruturais e imunocitoquímicos, é de que o cilindroma se forma a partir da porção enovelada do dueto écrino(6).
A malignização do cilindroma é rara(2,3). Cooper et al. (7) referem o relato de pelo menos 14 casos. Tal ocorrência é mais freqüente a partir de tumores em turbante(3,7). Usualmente a malignização é de um só tumor(2). Os cilindromas malignos são agressivos, com metástases disseminadas em linfonodos, vísceras e ossos(3). A morte se deve a metástases viscerais ou, em alguns casos, à invasão da cavidade craniana, com hemorragia e meningite(2). Como a maioria dos cilindro mas malignos se origina de tumores em turbante, os portadores desta modalidade de cilindroma devem ser acompanhados cautelosamente(3); é o que temos feito no presente caso, considerando a possibilidade de novos tumores no couro cabeludo não substituído pelo enxerto.
A terapia proposta é usualmente a cirúrgica, especialmente por questões estéticas(8); outras indicações são a ulceração, a infecção, a suspeita de malignização, o dano funcional (p.ex., auditivo) e eventualmente a dor(4,9); Irwin et al.(8) recomendam a excisão individual de lesões menores que 1 em de diâmetro ou localizadas em áreas cosmeticamente importantes. Ressecção ampla do couro cabeludo, seguida de enxerto cutâneo, reserva-se para os casos de tumor em turbante(8,9). Outras formas de tratamento incluem eletrocoagulação, radioterapia e dermo-abrasão(8).
É freqüente a recidiva após exérese de tumores isolados, chegando a 42% na série de Crain e Helwig(10). Talvez isto se deva ao crescimento multifocal ou à multinodularidade dos cilindromas(1).
BIBLIOGRAFIA
1. BATSAKIS JG. Dermal eccrine cylindroma.Ann.Otol. Rhinol. Laryngol. 1989; 98:991-992.
2. ELDER D, ELENITSAS R, RAGSDALE BD. Tumors of the epidermal appendages. In: ELDER D, ELENITSAS R, JAWORSKY C, JOHNSON B Jr. - Lever's Histopathology of the skin, Lippincott- Raven, Philadelphia, USA, 8th ed. 1997; 747-803.
3. SANTA CRUZ DJ. Tumors of sweat gland differentiation. In: FARMER ER, HOOD AF.- Pathology of the skin, Appleton-Lange, Norwalk, USA, 1990; 624-662.
4. GUZZO C, JOHNSON B. Unusual abdominal location of a dermal cylindroma. Cutis. 1995; 56:239-240.
5. BATSAKIS JG, BRANNON RB. Dermal analogue tumours of major salivary glands.J. Laryngol. Otol. 1981; 95:155-164.
6. COTTON DWK, BRAYE SG. Dermal cylindromas originate from the eccrine sweat gland. Brit. J.Dermatol. 1984; 111: 53-61.
7. COOPER PH, FRIERSON HF, MORRISON AG. Malignant transformation of eccrine spiradenoma. Arch.Dermatol. 1985; 121: 1445- 1448.
8. IRWIN LR, BAINBRIDGE LC, REID CA, PIGOTT TA, BROWN HG. Dermal eccrine cylindroma (turban tumour). Brit. J. Plast. Surg. 1990; 43: 702-705.
9. FREEDMAN AM, WOODS JE. Total scalp excision and auricular resurfacing for dermal cylindroma (turban tumor). Ann. Plast. Su'flJ. 1989; 22: 50-57.
10. CRAIN RC, HELWIG EB. Dermal cylindroma (dermal eccrine cylindroma). Am. J. Clin. Pathol. 1961; 35: 505-515.
I - Ex-residente de Cirurgia Plástica da Universidade Federal de Uberlândia.
II - Residente de Cirurgia Plástica da Universidade Federal de Uberlândia.
III - Chefe do Serviço de Cirurgia Plástica da Universidade Federal de Uberlândia.
IV - Professor Titular de Patologia da Universidade Federal de Uberlândia.
V - Professor adjunto de Cirurgia Plástica da Universidade Federal de Uberlândia.
Endereço para correspondência:
Anderson Gonçalves de Freitas Júnior
R. Francisco Antônio Fernandes, 209
Uberlândia - MG 38400-119



 Read in Portuguese
Read in Portuguese
                     Read in English
Read in English
                     PDF PT
PDF PT
                     Print
                    Print
                 Send this article by email
                    Send this article by email
                 How to Cite
                    How to Cite
                 Mendeley
                    Mendeley
                 Pocket
                    Pocket
                 Facebook
                    Facebook
                 Twitter
                    Twitter