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Review Article - Year2021 - Volume36 - Issue 3

http://www.dx.doi.org/10.5935/2177-1235.2021RBCP0098

RESUMO

A cirurgia de aumento primário de mamas ocupa o topo do ranking dos procedimentos estéticos mais realizado entre as mulheres. Na população masculina, outra cirurgia mamária ocupa lugar de destaque: a ginecomastia. A anestesia regional para as cirurgias plásticas faz parte de uma estratégia de analgesia multimodal que pode reduzir custos, diminuir a hospitalização e a dor no período pós-operatório. O objetivo deste trabalho é revisar e comparar as técnicas de anestesia regional guiadas por ultrassom mais utilizadas para analgesia perioperatória nas cirurgias plásticas estéticas das mamas. Foi realizada a revisão de estudos clínicos que investigaram a associação dos bloqueios anestésicos regionais guiados por ultrassom com cirurgias plásticas estéticas das mamas nos últimos 5 anos na base de dados MEDLINE/PubMed. Foram selecionados 14 artigos para revisão. As técnicas de anestesia regional guiada por ultrassom mais frequentemente relatadas foram o bloqueio paravertebral (BPV), os bloqueios interfasciais (PECS 1 e PECS 2), bloqueio do plano do serrátil (BPS) e bloqueio intercostal (BI). O menor consumo de opioides e melhor controle álgico pós-operatório foi associado ao BPV, PECS 1 e PECS 2 e BPS. O BPV apresentou maior incidência de complicações e os PECS 1 e PECS 2 mostraram-se de execução mais fácil. Os bloqueios interfasciais (PECS 1 e PECS 2) se mostraram mais seguros e de fácil execução nas cirurgias plásticas estéticas das mamas do que as outras modalidades de bloqueios. Promovem diminuição do uso de opioides e seus efeitos colaterais, redução no tempo de internação e na recuperação no pós-operatório.

Palavras-chave: Mamoplastia; Anestesia e analgesia; Dor pósoperatória; Manejo da dor; Implantes de mama.

ABSTRACT

Primary breast augmentation surgery is one of the most performed cosmetic procedures among women. In the male population, another breast surgery occupies a prominent place: gynecomastia. Regional anesthesia for plastic surgery is part of a multimodal analgesia strategy that can reduce costs, reduce hospitalization, and pain in the postoperative period. The purpose of this article is to review and compare the most used ultrasound-guided regional anesthesia techniques for perioperative analgesia in aesthetic plastic surgery of the breasts. A review of clinical studies that investigated the association of regional anesthesia techniques guided by ultrasound with cosmetic plastic surgery of the breast in the last 5 years was carried out in the MEDLINE/PubMed database. Fourteen articles were selected for review. The most frequently reported techniques of regional anesthesia guided by ultrasound were paravertebral block (PVB), interfascial block (PECS 1 and PECS 2), serratus plane block (SPB), and intercostal block (IB). The lower consumption of opioids and better postoperative pain control were associated with PVB, PECS 1 and PECS 2, and SPB. PVB had a higher incidence of complications and PECS 1 and PECS 2 proved to be easier to perform. Interfascial blocks (PECS 1 and PECS 2) proved to be safer and easier to perform in cosmetic plastic surgery of the breasts than other types of blocks. They decrease the use of opioids and its side effects, reduce the length of hospital stay and recovery in the postoperative period.

Keywords: Mammoplasty; Anesthesia and analgesia; Postoperative pain; Pain management; Breast implants.


INTRODUÇÃO

A cirurgia plástica estética é uma área da medicina em crescente expansão. Segundo dados da Sociedade Americana de Cirurgia Plástica Estética, desde o ano de 1997 até 2016, houve um aumento de 730% no número de procedimentos estéticos realizados por cirurgiões plásticos nos Estados Unidos da América, representando uma quantia de 15 bilhões de dólares gastos em 13 milhões de procedimentos realizados somente em 20161. Ao redor do mundo, esses números podem ultrapassar 33 milhões de procedimentos estéticos feitos por cirurgiões plásticos em 20162.

A cirurgia de aumento de mama com implante passou para o primeiro lugar entre as operações mais frequentes. Isso representa um crescimento de 6,1% em comparação com o ano de 2017 e 27,6% em comparação com 20143.

O Brasil subiu para o primeiro lugar no mundo em procedimentos de cirurgia estética com um total de 1.498.327 cirurgias plásticas estéticas realizadas, à frente dos Estados Unidos da América com 1.492.383. O procedimento cirúrgico mais popular para as mulheres foi a cirurgia de aumento de mama, com 1.841.098 procedimentos realizados no mundo. O procedimento cirúrgico mais popular para os homens foi a correção da ginecomastia, com 269.720 procedimentos3.

A anestesia regional para as cirurgias estéticas ou reconstrutivas das mamas é desafiadora para os anestesiologistas, não só pela natureza complexa da inervação da parede torácica e a variedade de técnicas descritas possíveis de serem executadas, mas também pela preocupação constante em proporcionar mínima dor pós-operatória.

Os bloqueios regionais diminuem o surgimento de dores crônicas pós- cirúrgicas e diminui o consumo de opioides e seus efeitos colaterais conhecidos. Possibilitando rápida recuperação e alta precoce, esse tipo de anestesia pode proporcionar uma experiência positiva aos pacientes com redução dos custos hospitalares4.

As técnicas de anestesia regional fazem parte de uma estratégia de analgesia multimodal. A popularidade crescente dos bloqueios regionais guiados por ultrassom vem impactando a prática anestésica de maneira profunda, aprimorando algumas técnicas já consagradas e introduzindo novas, à medida que mais estudos vêm sendo realizados5. Na prática diária do cirurgião plástico, os bloqueios anestésicos ainda não são realidade.

A revisão dos bloqueios regionais guiados por ultrassom para anestesia de cirurgias mamárias estéticas mostra-se atual e relevante, tendo em vista o cenário crescente desse tipo de cirurgia, bem como dos custos hospitalares. Alternativas anestésicas que permitam redução de permanência hospitalar, de custos, redução do uso de medicações analgésicas que causem constipação, náuseas, vômitos, retenção urinária, entre outras complicações, podem garantir maior segurança e melhorar a experiência do paciente no processo transoperatório.

OBJETIVO

O objetivo deste trabalho é revisar e comparar as técnicas de anestesia regional guiadas por ultrassom mais utilizadas para anestesia e analgesia perioperatória nas cirurgias plásticas estéticas das mamas.

MÉTODOS

Desenho da pesquisa

O estudo proposto é do tipo secundário e estabelece relação com artigos já publicados através da revisão de estudos clínicos que investigaram a associação dos bloqueios anestésicos regionais guiados por ultrassom com cirurgias plásticas estéticas das mamas.

Preceitos ético-legais

Este trabalho não possui quaisquer violações dos preceitos ético-legais estabelecidos pelo comitê de ética em pesquisa da Universidade Federal de São Paulo, por se tratar de projeto observacional de revisão da literatura já publicada.

Captação de fomento

O projeto apresentado foi desenvolvido com recursos próprios dos pesquisadores responsáveis.

Casuística

Para realização deste trabalho foram levantados artigos já publicados nas bases de dados MEDLINE, utilizando-se como ferramenta de busca o portal PubMed até a data de 20 de dezembro de 2019.

A pesquisa combinou termos para cirurgias estéticas das mamas, anestesia regional guiada por ultrassom, anestesia perioperatória e dor pós-operatória. Os termos pesquisados na base de dados MEDLINE/PubMed foram: “regional anaesthesia”, “breast augmentation”, “regional anaesthesia”, “aesthetic plastic surgery”, “serratus plane block”, “erector spinae plane block”, “paravertebral block”, “pecs block” e “post operative pain”.

Os filtros adicionados nessa base de dados foram: artigos publicados nos últimos 5 anos, artigos de revisão, artigos em inglês e artigos similares. Os critérios de inclusão, não inclusão e exclusão dos artigos encontrados estão listados na Quadro 1.

Quadro 1 - Critérios de seleção dos estudos.
Critérios de
inclusão
Critérios de
exclusão
Critérios de não-
inclusão
Publicados nos
últimos 5 anos
Estudos de áreas
não relacionadas a
cirurgias estéticas
das mamas
Ausência de relação
cirurgia das mamas
- bloqueio regional
Artigos de revisão   Duplicidade de
estudos
Artigos em inglês  
Ensaios clínicos
Quadro 1 - Critérios de seleção dos estudos.

RESULTADOS

Na base de dados MEDLINE/PubMed, a pesquisa dos termos “regional anaesthesia” AND “breast augmentation” resultou em 27 artigos. Aplicados os filtros e os critérios e seleção dos estudos, apenas 1 artigo foi selecionado para análise.

A busca dos termos “regional anaesthesia” AND “aesthetic plastic surgery” não resultou em nenhum artigo.

Pesquisados em combinação os termos “regional anaesthesia” AND “aesthetic plastic surgery” AND “breast augmentation”, um total de 0 artigos foram encontrados na base de dados MEDLINE/PubMed.

Pesquisando-se os termos “serratus plane block” AND “breast augmentation” e aplicando-se os critérios de seleção dos estudos, um total de 7 artigos foram selecionados para análise.

Buscando-se os termos “erector spinae plane block” AND “breast augmentation” e aplicando-se os critérios de seleção dos estudos, nenhum artigo preencheu os critérios de elegibilidade.

A combinação dos termos “paravertebral block” AND “breast augmentation” resultou em um total de 5 artigos ao aplicarmos os filtros e critérios de seleção.

Os termos “pecs block” AND “breast augmentation” quando pesquisados e aplicando-se os critérios de seleção dos estudos, originaram um total de 4 artigos que foram selecionados para análise.

A pesquisa dos termos “post operative pain” AND “aesthetic plastic surgery”, resultou em 0 artigos.

Na pesquisa da combinação dos termos “post operative pain” AND “aesthetic plastic surgery”, um total de 0 artigos foram encontrados na base de dados MEDLINE/PubMed.

Finalizando a pesquisa, os termos buscados “post operative pain” AND “breast augmentation”, não resultou em nenhum artigo.

Na base de dados MEDLINE, utilizando-se do portal de buscas PubMed, portanto, foram encontrados ao todo 16 artigos com os critérios descritos. Destes, 2 artigos estavam em duplicidade, resultando em 14 artigos que preenchiam os critérios de inclusão, exclusão e não-inclusão estabelecidos na metodologia.

Dos estudos analisados, as técnicas de anestesia regional guiada por ultrassom mais utilizadas foram 5: o bloqueio paravertebral (BPV) e bloqueios interfasciais (PECS 1 e PECS 2), bloqueio do plano do serrátil (BPS) e bloqueio intercostal (BI).

As revisões dos estudos analisando a analgesia proporcionada pelo bloqueio paravertebral para pacientes submetidos a cirurgias de mama, concluíram que os pacientes apresentaram melhor estabilidade hemodinâmica e alívio de dor equivalente, comparados à anestesia peridural torácica6. Estudos comparando seu efeito imediato e a longo prazo, demonstraram seu efeito analgésico superior em ambos os momentos, em relação aos pacientes que receberam apenas analgesia sistêmica, ao mesmo tempo em que, houve diminuição no consumo de opioides e seus efeitos adversos típicos, como náuseas e vômitos, por exemplo4,7.

Entretanto, ao estudar pacientes com até 12 meses de pós-operatório, a análise sequencial dos ensaios mais recentes não encontrou evidências suficientes de que o bloqueio paravertebral seria capaz de evitar dor crônica a longo prazo, em contraste com outras metanálises com poucos estudos previamente apresentados8. Os estudos demonstraram seu efeito na redução da intensidade da dor cônica e não seu potencial em evitá-la8,9.

Embora fora do escopo do presente trabalho, é importante mencionar o papel deste bloqueio em cirurgias reconstrutivas. O bloqueio paravertebral demonstrou benefícios clinicamente significativos pós-operatórios para pacientes submetidas a cirurgias mamárias reconstrutivas relacionadas ao câncer de mama. Esse tipo de bloqueio feito de forma contínua com uso de cateter demonstrou mais benefícios para utilização em cirurgias torácicas e mamárias reconstrutivas extensas, com grande potencial de cronificação da dor. Porém, o uso de cateter não demonstrou ser superior às técnicas de injeção única em um único ou vários níveis4,10. As complicações relatadas com o uso do BPV foram punção pleural com pneumotórax, dispersão de anestésico local para o espaço peridural, hipotensão intraoperatória significativa e punção inadvertida de vasos.

Estudos comparando o PECS 2 com o bloqueio paraverbtebral (BPV) em injeção única a nível de T4 para cirurgias mamárias, observaram que os pacientes do grupo PECS 2 apresentaram menor consumo de opioides intraoperatório e melhor controle da dor pós-operatória nas primeiras 12h. Também apresentaram melhor cobertura analgésica da região axilar e menos náuseas6. Porém, quando avaliados os escores de dor (escala visual analógica-EVA) após as primeiras 12 horas de pós-operatório, os pacientes do grupo BPV apresentavam menos dor. O tempo para solicitar uso de morfina foi maior no grupo PECS 2 e o consumo geral de opioides também foi menor neste grupo5,10.

Um estudo recente avaliou a combinação do PECS 1 e o BPV comparando-o com o BPV associado à sedação em 60 pacientes submetidas a cirurgias mamárias, com colocação de implantes subpeitorais. Esta combinação foi feita com o objetivo de proporcionar mais conforto perioperatório. Os níveis de dor (EVA) foram significativamente menores no grupo tratado com a associação dos bloqueios PECS 1 e BPV nas primeiras 8h, mas não após 24h. Além disso, foi observado necessidade reduzida de sedação intraoperatória, sem diferenças estatisticamente significativas em relação a náuseas e vômitos pós-operatórios11-13.

Quando comparado apenas à analgesia sistêmica, o PECS 2 apresentou uma redução na necessidade de opioides nas primeiras 24h em 13,6mg de morfina via oral, prolongou a primeira solicitação de analgésicos em 301 minutos e reduziu a pontuação no escore de dor (escala visual analógica) em 0,9 a 1,9 pontos, em média12. Além disso, teve impacto na diminuição da incidência de náuseas e vômitos, proporcionou menor sedação pós-operatória, com menor tempo de permanência na recuperação pós-anestésica e de internação hospitalar10. Nenhuma complicação na execução desta técnica foi reportada14.

O PECS 2 também foi utilizado como técnica anestésica associado à sedação com dexmedetomidina, sem anestesia geral. Após 15 minutos de bloqueio com 10ml entre os músculos peitoral maior e menor, e 20ml entre o peitoral menor e o músculo serrátil anterior, com bupivacaína a 0,25%, já se obteve analgesia suficiente para início do procedimento cirúrgico, mantendo apenas a dexmedetomidina contínua. Seu efeito permaneceu por aproximadamente 8 horas e analgésicos não foram solicitados por 1 dia14.

Estudos comparativos avaliaram o bloqueio do plano do serrátil (BPS) superficial e o BPV em cirurgias estéticas de mama. Relatou-se menor consumo de opioides intraoperatório, porém o tempo para a primeira solicitação de analgésicos foi mais longo no grupo que recebeu o BPV12.

Avaliando-se os bloqueios intercostais (BI) nas cirurgias de colocação de prótese de mama subpeitoral, estudos mostraram que não houve diferença nos scores de dor (EVA) com 1, 3, 6, 24, 48 ou 72 horas entre os pacientes submetidos ao BI e os que não receberam BI. Conclui-se também que não houve diferença no consumo de opioides no pós-operatório entre os pacientes submetidos ao BI e aos que não foram submetidos ao bloqueio10.

Nos artigos selecionados não foram encontrados estudos relacionando cirurgias mamárias estéticas ao bloqueio do plano do eretor da espinha que estivessem de acordo com os critérios de seleção.

DISCUSSÃO

Os diversos tipos de cirurgias plásticas mamárias envolvem manipulação de diferentes tecidos e incisões cirúrgicas. O conhecimento anatômico das diversas estruturas envolvidas em cada uma das técnicas é de extrema importância no planejamento analgésico perioperatório10.

A mamoplastia de aumento primário com inclusão de prótese de silicone tem sido a cirurgia mamária estética mais realizada no mundo, nos EUA e no Brasil3,15, com frequente tendência crescente nos últimos anos. Essa expressiva importância do procedimento dentro da cirurgia plástica contrasta com a relativa escassez de estudos encontrada no presente trabalho. Considerando-se o desenvolvimento recente dos aparelhos de ultrassom portáteis e aplicando-se os critérios de seleção descritos, o total de 14 estudos encontrados para análise final demonstra a necessidade de maior atenção ao tema.

A correlação entre os diferentes bloqueios anestésicos regionais e as diversas vias de acesso (inframamária, periareolar, transaxilar e até umbilical), planos de inserção de próteses e os variados tipos de cirurgias mamárias representa um extenso campo de pesquisa ainda pouco explorado. Bloqueios considerados agressivos na literatura pesquisada e desaconselhados na cirurgia estética (como o BPV) podem ser indicados na abordagem transaxilar, na qual a lesão cirúrgica do nervo intercostobraquial pode resultar em dor axilar aguda e crônica10; da mesma forma, a dissecção cirúrgica para inserção do implante entre os músculos peitoral maior e peitoral menor envolve o estiramento das fibras musculares, com o descolamento de suas porções anexas aos anéis cartilaginosos das costelas adjacentes, gerando grande potencial de dor miofascial pós-operatória e indicando a necessidade de um bloqueio mais abrangente. De fato, um dos estudos verificou que 9,5% dos pacientes submetidos à mamoplastia com inserção submuscular dos implantes desenvolveram dor pós-operatória persistente, de moderada à grave e 38% preencheram critérios para diagnóstico de dor neuropática10.

Outras modalidades de cirurgias mamárias estéticas realizadas, como a mastopexia, a mamoplastia redutora e a correção de ginecomastia, em que apenas o excesso de pele e tecido glandular é removido e os músculos peitorais são poupados, possuem menor potencial álgico do ponto de vista analgésico perioperatório10.

No presente estudo, os 5 bloqueios regionais comumente associados às cirurgias estéticas mamárias representam ampla gama de alternativas às técnicas anestésicas tradicionalmente utilizadas, como a peridural e a anestesia geral. Desde a introdução pioneira do BPV descrito por Hugo Sellheim, em 190516, a incorporação da ultrassonografia na realização dos bloqueios regionais representou o maior aprimoramento das técnicas, permitindo visualização direta da agulha, da injeção do anestésico e das estruturas anatômicas envolvidas5. Porém, apesar do conhecimento anatômico preciso e da ampla incorporação do ultrassom, mais estudos padronizando técnicas e protocolos específicos do BPV sobre visão direta ainda se fazem necessários. Diferentes abordagens para execução do bloqueio foram propostas, porém estudos que considerem desfechos das várias abordagens buscando uma técnica “padrão ouro” são infrequentes. A heterogeneidade de seleção dos pacientes, diferentes tipos de cirurgias, técnicas, anestésicos locais e adjuvantes utilizados para os bloqueios dificultaram a comparação entre as técnicas17.

Além disso, embora seja tentador dizer que os bloqueios guiados por ultrassom oferecem menor risco de complicações pela visualização em tempo real da agulha e da dispersão do anestésico local, não há dados na literatura suficientes para embasar essa afirmação até este momento. Desta forma, não são infrequentes relatos na literatura de punções pleurais, pneumotórax, colocação de cateteres intratorácicos, punção intratecal inadvertida e casos de hipotensão intraoperatória significativa em BPV guiados por ultrassom7. Dessa forma, o uso do BPV para cirurgias estéticas não tem sido recomendado como primeira opção. Cirurgias mamárias estéticas devem ser conduzidas com outras técnicas de analgesia multimodal associadas a bloqueios regionais menos invasivos na maioria dos pacientes, com o bloqueio paravertebral reservado como técnica de resgate analgésico ou para pacientes com alto risco de dor crônica ou dor pós-operatória excessiva4.

Além do BPV, os bloqueios PECS 1, PECS 2 e BPS foram as modalidades de anestesia regional mais frequentemente relatadas na literatura pesquisada, estabelecendo-se como alternativas efetivas e menos invasivas do que o BPV17.

As principais vantagens relatadas em relação aos PECS e o bloqueio do plano serrátil são a relativa facilidade de visualização e execução da técnica guiada por ultrassom. A superficialidade das estruturas anatômicas relacionadas, seu mínimo potencial de complicações comparado ao bloqueio peridural e paravertebral torácico, com bloqueio sensitivo e sem risco de bloqueio simpático são vantagens frequentemente elencadas. Ambos PECS e o bloqueio do serrátil apresentam boa cobertura da região anterolateral do tórax, inclusive para cirurgias ambulatoriais, também passível de serem executadas em pacientes recebendo terapia de anticoagulação. Porém, cabe lembrar que, mesmo infrequentes, pneumotórax e hematoma por punção acidental da artéria toracodorsal são possíveis complicações a serem consideradas nesta modalidade de bloqueio14,18.

Comparados aos demais bloqueios, o PECS 2 apresentou evidentes vantagens. Os estudos mostram menor consumo de opioides no intra e pós-operatório, prolongamento na primeira solicitação de analgesia no pós-operatório, redução na pontuação na EVA, menor incidência de náuseas e vômitos, menos sedação intraoperatória com pouco tempo de permanência na recuperação pós- anestésica e redução do período de internação5,6,10,14. Feito isoladamente como única técnica de bloqueio regional, o PECS 2 consta na literatura como a alternativa mais segura e eficaz para analgesia em cirurgias plásticas estéticas das mamas, inclusive podendo ser a única técnica analgésica que pode ser associada apenas à sedação. Há que se considerar, no entanto, que o PECS 2 bloqueia de maneira eficaz a porção anterior do tórax e das mamas, podendo falhar nas porções laterais das mamas. Daí a ideia de associar as diferentes modalidades de bloqueios.

A associação do BPV ao PECS 2 como um bloqueio anestésico, mostrou- se uma alternativa eficaz para realização de cirurgias mamárias sem o uso de anestesia geral5,18.

Os bloqueios interfasciais quando comparados à anestesia geral somente, se mostraram úteis na redução das necessidades analgésicas intra e pós-operatórias. Tanto o PECS 2 quanto a associação entre o PECS 1 e o bloqueio do plano serrátil mostraram-se boas estratégias analgésicas para cirurgias envolvendo a região anterolateral do tórax5,18.

Contudo, por se tratarem de uma modalidade de bloqueios em que sua eficácia está relacionada ao volume de anestésico injetado e sua dispersão entre os planos, o maior risco associado aos bloqueios interfasciais é a intoxicação por anestésico local. Além disso, apresentam como limitação, assim como outras técnicas de injeção única, restrita duração do tempo de ação. Ainda não está claro se o uso de adjuvantes como a clonidina, dexametasona ou a dexmedetomidina, por exemplo, tem a capacidade de prolongar o efeito dos bloqueios interfasciais assim como fazem nos outros tipos de bloqueios nervosos12.

Nos estudos avaliados os bloqueios intercostais demonstraram ter eficácia analgésica equivalente à infiltração com anestésico local na incisão, feita no intraoperatório pela equipe cirúrgica12.

Apesar de os bloqueios torácicos serem amplamente relatados na literatura, observou-se que muitos artigos relatavam o uso das técnicas de anestesia regional em cirurgias reconstrutivas de mama e cirurgias torácicas. Uma das principais limitações encontradas no presente estudo de revisão foi a escassez de estudos correlacionando os bloqueios exclusivamente à cirurgia plástica estética da mama, além da grande heterogeneidade entre os estudos. Dificultou-se, assim, comparações quantitativas, deixando ainda lacunas a respeito da eficácia e superioridade/inferioridade de cada um dos tipos de bloqueios nessa modalidade específica de cirurgia mamária17.

A maioria das evidências produzidas em relação aos bloqueios para cirurgias estéticas de mama existem na forma de relatos ou séries de casos, se fazendo necessários mais ensaios clínicos randomizados, bem estruturados, em grupos homogêneos, para avaliar cada uma dessas técnicas. As diferentes associações de bloqueios encontradas foram conduzidas sem critérios ou diretrizes a respeito dos bloqueios a serem utilizados para cada tipo de cirurgia, especificamente. A necessidade de padronização de uma determinada técnica que demonstre máxima eficácia, ficou evidenciada após a constatação da escassez de estudos, frente ao universo robusto da cirurgia plástica estética17.

Esta revisão observou que nenhum bloqueio cobre efetivamente toda a mama e a região axilar. Portanto, uma combinação de bloqueios deve ser usada dependendo do local da incisão e via de acesso para colocação da prótese mamária. Atualmente, com a escassez de grandes estudos clínicos randomizados bem conduzidos, é difícil determinar a superioridade de uma técnica sobre a outra14.

CONCLUSÃO

A descrição dos diferentes tipos de bloqueios regionais para analgesia em cirurgias plásticas mamárias tem sido frequentemente relatada na literatura. Isoladamente, os bloqueios interfasciais (PECS 1 e PECS 2) se mostram mais promissores, seguros e de fácil execução nas cirurgias plásticas estéticas das mamas do que as outras modalidades de bloqueios. Promovem diminuição do uso de opioides e seus efeitos colaterais, redução no tempo de internação e na recuperação no pós-operatório. A associação de bloqueios regionais pode diminuir o uso de anestesia geral e bloqueios do neuroeixo e suas complicações, permitindo cirurgias apenas com sedação e bloqueios regionais. Apesar das perspectivas animadoras, ensaios clínicos e estudos prospectivos com níveis mais elevados de evidência científica se fazem necessários.

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1. Human Clinic, Cirurgia Plástica, São Paulo, SP, Brasil.

Instituição: Human Clinic, Cirurgia Plástica, São Paulo, SP, Brasil.

COLABORAÇÕES

LDF Análise e/ou interpretação dos dados, Análise estatística, Aprovação final do manuscrito, Coleta de Dados, Conceitualização, Concepção e desenho do estudo, Gerenciamento de Recursos, Metodologia, Redação - Preparação do original, Redação - Revisão e Edição, Supervisão, Visualização

LMLO Análise e/ou interpretação dos dados, Análise estatística, Aprovação final do manuscrito, Aquisição de financiamento, Conceitualização, Metodologia, Realização das operações e/ou experimentos, Redação - Preparação do original, Redação - Revisão e Edição, Visualização

Autor correspondente: Leandro Dário Faustino Rua Diogo Jacome, nº 50 - Vila Nova Conceição, São Paulo, SP, Brasil CEP 04512-000 E-mail: doutorleandrofaustino@gmail.com

Artigo submetido: 18/12/2020.
Artigo aceito: 19/04/2021.

Conflitos de interesse: não há.

 

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