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Ideas and Innovation - Year2023 - Volume38 - Issue 1

http://www.dx.doi.org/10.5935/2177-1235.2023RBCP680-PT

RESUMO

Introdução: Os tumores não melanomas acometem frequentemente a região palpebral inferior e consistem em um desafio para a reconstrução da ferida operatória sem ocasionar alteração funcional ou estética. O fechamento primário geralmente não é possível e os retalhos são preferenciais aos enxertos por gerarem menor retração palpebral. Este artigo tem como objetivo descrever uma nova técnica de reconstrução cirúrgica.
Método: Descreve-se técnica modificada do retalho de McGregor para correção de defeito cirúrgico maior que 50% da lamela anterior, de lesão recidivada de carcinoma basocelular localizada em pálpebra inferior.
Resultados: Paciente foi avaliada no 7º, 14º, 21º e 45º dia de pósoperatório. Apresentou boa resposta funcional e estética com a técnica utilizada.
Conclusão: Demonstramos uma nova técnica de fechamento de defeitos maiores do que dois terços na pálpebra inferior através do retalho de dupla transposição.

Palavras-chave: Procedimentos cirúrgicos reconstrutivos; Retalhos cirúrgicos; Carcinoma basocelular; Neoplasias palpebrais; Pálpebras

ABSTRACT

Introduction: Non-melanoma tumors frequently affect the lower palpebral region and constitute a challenge for reconstructing the surgical wound without causing functional or aesthetic changes. Primary closure is generally impossible, and flaps are preferred over grafts as they generate less eyelid retraction. This article aims to describe a new surgical reconstruction technique.
Method: A modified McGregor flap technique is described for correcting a surgical defect greater than 50% of the anterior lamella of a recurrent basal cell carcinoma lesion in the lower eyelid.
Results: The patient was evaluated on the 7th, 14th, 21st, and 45th postoperative days. She presented a good functional and aesthetic response to the technique used.
Conclusion: Using the double transposition flap, we demonstrate a new technique for closing defects larger than two-thirds in the lower eyelid.

Keywords: Reconstructive surgical procedures; Surgical flaps; Carcinoma, basal cell; eyelid neoplasms; Eyelids


INTRODUÇÃO

As neoplasias cutâneas são frequentes na face e causam morbidade funcional e estética aos pacientes, sendo o carcinoma basocelular (CBC) o tipo mais comum1. O câncer de pele melanoma e não melanoma acomete a região palpebral em 5 a 10% dos casos2. A reconstrução da pálpebra inferior após exérese de neoplasia ou trauma é um desafio, devido à pequena quantidade de tecido sobressalente.

A escolha do melhor retalho depende da localização, do tamanho e profundidade (se há comprometimento tarsal, ou seja, da lamela posterior). Defeitos cirúrgicos superficiais requerem somente a reconstrução da lamela anterior (pele e músculo), já defeitos de espessura total necessitam que ambas as lamelas, anterior e posterior (tarso e conjuntiva), sejam reconstruídas3,4. Objetiva-se, por meio deste artigo, descrever uma nova opção de técnica para reconstrução de ferida operatória.

Para evitar a retração da área e prevenir a ocorrência de ectrópio, devido à tensão vertical no local, os retalhos são preferências nos defeitos maiores que 33% da pálpebra acometida. Os retalhos mais utilizados para reconstrução palpebral são: avanço com ou sem cantotomia; transposição; Mustardé; McGregor; Fricke; Landolt-Hughes; Dutupuys-Dutemps-Hughes (utiliza pele e mucosa da pálpebra superior); e Abbe3.

OBJETIVO

Este artigo traz uma nova proposta cirúrgica, para facilitar a reconstrução da pálpebra inferior, quando ocorre acometimento da lamela anterior maior do que dois terços, através do retalho de dupla transposição.

MÉTODO

Paciente feminina, 70 anos, com recidiva, após 9 anos da primeira cirurgia sem controle de margens, de CBC na topografia da pálpebra inferior direita, deu entrada no Instituto Azulay, no Rio de Janeiro, RJ . Ao exame clínico, observava surgimento há 6 meses de lesão perolada, com exulcerações e 19x12mm de diâmetro (Figura 1). A dermatoscopia revelou presença de eritema, ulceração, folhas de bordo, alguns ninhos ovoides e crisálides.

Figura 1 - Delimitação dermatoscópica do carcinoma basocelular em pálpebra inferior direita, com tamanho de 19x12mm.

Em 19 de outubro de 2021, a paciente foi submetida a anestesia local com solução tumescente modificada de Klein e excisão completa do tumor com congelação intraoperatória. Após ampliação de margens cirúrgicas de um CBC infiltrativo, obteve-se um defeito maior que 50% da lamela anterior (Figura 2).

Figura 2 - Após ampliação de margens cirúrgicas de um carcinoma basocelular infiltrativo, obteve-se um defeito maior que 50% da lamela anterior.

Optou-se primeiramente pelo retalho de McGregor, com a finalidade de fechamento da ferida, porém, devido à pouca mobilidade do tecido, não foi possível realizar o movimento programado de avanço do retalho após interpolação dos triângulos da zetaplastia.

Sendo assim, o retalho de McGregor foi modificado. Após a incisão em formato de M na região temporal – lateral ao defeito –, foram criados dois triângulos simétricos com seu maior eixo do tamanho do maior raio da ferida (Figura 3). Realizou-se descolamento do tecido da região malar, temporal e transposição do primeiro triângulo em direção à ferida para fechamento do defeito primário e, em seguida, transposição do segundo triângulo para fechamento da área do primeiro triângulo. Por fim, o espaço do segundo triângulo foi fechado primariamente. Sendo assim, o movimento do primeiro triângulo foi uma combinação dos movimentos de transposição e rotação para conseguir fazer o tecido deslocar até a ferida operatória.

Figura 3 - Modificação da Técnica do Retalho de McGregor. Realizados dois triângulos simétricos com seu maior eixo do tamanho do maior raio da ferida. Transposto o primeiro triângulo em direção à ferida para fechamento do defeito primário e, em seguida, transposição do segundo triângulo para fechamento da área do primeiro triângulo.

Foram feitos pontos de Gilles, para fixação de cada ponta dos triângulos transpostos, e pontos internos e externos com mononylon 5.0 (Figura 4).

Figura 4 - Pós-operatório imediato.

RESULTADOS

A paciente não apresentou complicações importantes durante o período de pós-operatório. São esperados edema da pálpebra, com dificuldade da abertura ocular e discreto hematoma nos primeiros dias após a cirurgia, que costumam resolver-se em uma semana. Recebeu antibioticoterapia profilática com cefadroxila. Os pontos foram retirados no 14º dia de pós-operatório e, a partir do 21º, foi orientada massagem para drenagem do edema residual e fotoproteção. As fotos foram tiradas no pós-operatório imediato, no 7º, 14º, 21º e 45º dia de pós-operatório (Figura 5).

Figura 5 - 45º dia pós-operatório, bom resultado estético e funcional.

O resultado foi satisfatório, com manutenção da estética e funcionalidade local, além de propiciar uma cicatriz discreta e pouco perceptível.

DISCUSSÃO

A reconstrução palpebral é desafiadora, devido às características anatômicas e fisiológicas dessa área. Baseia-se principalmente em dois fatores: espessura e extensão do defeito5. A pálpebra inferior e o canto medial são as regiões mais acometidas e esses tumores cutâneos periorbitais podem ser de difícil manejo, sendo comumente tratados com excisão cirúrgica6.

Apesar de haver muitas técnicas cirúrgicas disponíveis, não existe um método de escolha preferencial. Entre as modalidades disponíveis, para fechamento da pálpebra inferior, há os retalhos de transposição como Tripier, que consiste em um retalho de transposição miocutâneo, o de Fricke, o de Kreibig e o retalho nasolabial com base superior. Entre os retalhos de avanço, há o McGregor (que associa técnica de avanço com zetaplastia) e o de Imre. Quanto aos de rotação, o de Mustardè é uma opção muito utilizada para reparar defeitos extensos da lamela anterior da pálpebra inferior ou em combinação com enxerto de cartilagem e mucosa para fechamento da lamela posterior7.

O retalho de transposição com zetaplastia é uma possibilidade de fechamento para vários defeitos cirúrgicos localizados na face, pois permite um completo redirecionamento do vetor de tensão através de ilhas de pele sã. Por essas características, é indicado para fechamento de defeitos próximos às margens livres como asa nasal, lábios, hélice e pálpebras8.

Em 1973, McGregor publicou a zetaplastia periorbital lateral associada ao movimento de avanço, sendo uma excelente alternativa dentro do arsenal terapêutico reconstrutivo6,9. Neste caso, a zetaplastia é realizada na extremidade lateral da incisão, sendo a largura do defeito correspondente ao ramo central do Z. O ramo descendente lateral e o ramo ascendente do Z têm o mesmo comprimento do ramo central e formam um ângulo de 60 graus com o mesmo. A cantotomia lateral é realizada para permitir o avanço do retalho e cobertura do defeito da pálpebra. Após interpolação dos retalhos, eventuais excessos de pele são aparados6,9. Diferentemente disso, ao invés de realizar o movimento de avanço após a interpolação dos triângulos da zetaplastia, nesta paciente, realizamos uma incisão em M e houve combinação do movimento de transposição e rotação do primeiro triângulo (Figura 6), com posterior transposição do segundo triângulo. Nos demais trabalhos encontrados na literatura, a construção de retalho de transposição duplo, triplo ou até mesmo quádruplo é feita em ângulos opostos e equidistante ao maior diâmetro do defeito cirúrgico, porém nesse caso haveria risco de ectrópio, sendo realizada técnica diferente das já publicadas.

Figura 6 - Desenho compara a técnica já descrita de McGregor (A) e o retalho modificado (B) com transposição e rotação do primeiro lóbulo (ilustrado por estrela, círculo) para fechamento do defeito primário e transposição do segundo lóbulo (3) para fechamento do defeito secundário.

Dessa maneira, esse relato demonstra uma técnica de um duplo retalho de transposição, na qual seu desenho foi inspirado no retalho de McGregor, diferenciando-se das demais técnicas descritas.

REFERÊNCIAS

1. Rodrigues EW, Moreira MR, Menegazzo PB. Análise do Tratamento do Carcinoma Basocelular. Rev Bras Cir Plást. 2014;29(4):504-10.

2. Kanski JJ, Bowling BB. Pálpebras. In: Kanski JJ, Bowling BB. Oftalmologia Clínica: uma abordagem sistemática. 8ª ed. Rio de Janeiro: Elsevier; 2016. p. 15-20.

3. Benez MDV, Sforza D, Mann D, Silva SCM. Reconstrução de pálpebra inferior com retalho cutâneo e enxerto de mucosa oral. Surg Cosmet Dermatol. 2014;6(2):17882.

4. Lima DA . Reconstrução total de pálpebra inferior com associação dos retalhos de Hughes e Destro. Rev Bras Cir Plást. 2018;33(3):364-73.

5. Vieira R, Pinho A, Brinca A. Reparo da pálpebra inferior por fechamento direto com cantopexia lateral e elevação da fáscia suborbicular dos olhos: uma técnica simples para evitar o ectrópio pós-operatório. Surg Cosmet Dermatol. 2018;10(4):346-8.

6. Almeida ACM, Alves JCRR, Pereira NA, Jamil LC, Portugal EH, Fonseca RPL, et al. Retalho de McGregor: uma alternativa para reconstrução de pálpebra inferior e região periorbital. Rev Bras Cir Plást. 2018;33(2):229-35.

7. Vieira R, Goulão J. Algoritmo para reparo das pálpebras. Surg Cosmet Dermatol. 2019;11(2):91-6.

8. Stolf HO, Abbade LPF. Principais tipos e indicações de Retalhos. In: Gadelha AR, Costa IMC, eds. Cirurgia dermatológica em consultório. São Paulo: Atheneu; 2017.

9. McGregor IA. Eyelid reconstruction following subtotal resection of upper or lower lid. Br J Plast Surg. 1973;26(4):346-54.











1. Instituto de Dermatologia Prof. Rubem David Azulay, Cirurgia Dermatológica, Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil

Autor correspondente: Lissiê Lunardi Sbroglio Bastian Departamento de Cirurgia Dermatológica, Instituto de Dermatologia Professor Ruben David. Azulay. Rua Santa Luzia, 206, Centro, Rio de Janeiro, RJ, Brasil. CEP: 20020-022 E-mail: lissiesbroglio@gmail.com

Artigo submetido: 13/12/2021.
Artigo aceito: 13/09/2022.

Conflitos de interesse: não há.

 

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