ISSN Online: 2177-1235 | ISSN Print: 1983-5175

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Case Report - Year2023 - Volume38 - Issue 4

http://www.dx.doi.org/10.5935/2177-1235.2023RBCP0840-PT

RESUMO

Introdução: Os arcos branquiais são os precursores embriológicos da face, pescoço e faringe. As anomalias dos arcos branquiais são a segunda lesão congênita mais comum de cabeça e pescoço em crianças. Entre essas anomalias, estão os cistos de arcos branquiais (BCC), que surgem devido a uma incorreta obliteração das fendas branquiais, ainda no período embrionário. Os BCC podem ser assintomáticos, apenas percebidos incidentalmente, e não se manifestar até a idade adulta.
Resultados: Anomalias do segundo arco branquial devem ser consideradas como um dos possíveis diagnósticos diferenciais de massas cervicais, especialmente as que se manifestam como um abaulamento em região lateral do pescoço. Os BCC são formações de revestimento epitelial, sem aberturas externas. Após seu diagnóstico, o tratamento é cirúrgico, usualmente por meio de uma incisão cervical transversa e cuidadosa dissecação das estruturas, com o objetivo de extirpar toda a lesão.
Conclusão: O método descrito, de excisão da lesão, por meio de incisão transversa em região cervical, dissecção tecidual por planos e ressecção de massa cística, é uma opção para o tratamento dessa deformidade, com adequado resultado estético e boa reprodutibilidade.

Palavras-chave: Região branquial; Procedimentos de cirurgia plástica; Cisto epidérmico; Genética; Diagnóstico diferencial

ABSTRACT

Introduction: The branchial arches are the embryological precursors of the face, neck, and pharynx. Branchial arch anomalies are the second most common congenital head and neck lesions in children. Among these anomalies are branchial arch cysts (BCC), which arise due to incorrect obliteration of the branchial slits, still in the embryonic period. BCCs may be asymptomatic, only noticed incidentally, and not manifest until adulthood.
Results: Anomalies of the second branchial arch should be considered as one of the possible differential diagnoses of neck masses, especially those that manifest as a bulge in the lateral region of the neck. BCCs are epithelial lining formations without external openings. After diagnosis, treatment is surgical, usually through a transverse cervical incision and careful dissection of the structures, with the aim of extirpating the entire lesion.
Conclusion: The method described of excision of the lesion through a transverse incision in the cervical region, tissue dissection in planes, and resection of the cystic mass is an option for the treatment of this deformity, with adequate aesthetic results and good reproducibility.

Keywords: Branchial region; Plastic surgery procedures; Epidermal cysts; Genetics; Diagnosis, differential.


INTRODUÇÃO

Os arcos branquiais são os precursores embriológicos da face, pescoço e faringe e as anomalias que os acometem são a segunda lesão congênita mais comum de cabeça e pescoço em crianças, sendo divididas em 4 grupos: as do primeiro, segundo, terceiro e quarto arco branquial, dependendo de sua localização1. As anomalias do segundo arco branquial são as mais prevalentes e correspondem a 95% das alterações encontradas no aparato branquial.

As deformidades dos arcos branquiais podem se apresentar como cistos, tratos sinusais, fístulas ou remanescentes cartilaginosos2. No caso dos cistos de arcos branquiais (BCC), ocorrem usualmente em crianças mais velhas e adultos jovens, enquanto as fístulas estão presentes em lactentes ou crianças menores. No caso descrito, a paciente apresentou o cisto aos 24 anos.

Os BCC podem ser assintomáticos, apenas percebidos incidentalmente, e não se apresentar até a idade adulta, ou se manifestar por meio de sintomas inespecíficos, incluindo edema na região do pescoço ou infecções recorrentes1. O diagnóstico normalmente é feito com o exame clínico e o auxílio de imagem. O tratamento é cirúrgico, com a excisão completa da lesão, usualmente por meio de uma incisão cervical transversa e cuidadosa dissecação das estruturas, com o objetivo de remover toda a lesão3.

OBJETIVO

Neste relato, apresentamos o caso de uma paciente feminina, de 24 anos, com diagnóstico de cisto de segundo arco branquial. O objetivo deste relato é correlacionar o caso descrito com o conhecimento disponível na literatura. Em função do BCC de segundo arco ser um dos diagnósticos diferenciais de massas na região cervical, e muito frequentemente subdiagnosticado, é de suma importância que o cirurgião saiba identificá-lo, a fim de evitar diagnósticos incorretos e promover o manejo adequado do paciente.

RELATO DE CASO

Paciente feminina, 24 anos, primípara, buscou atendimento ambulatorial na Universidade de Passo Fundo-RS, em dezembro de 2022 por apresentar nódulo em região cervical anterior, de 7cm de diâmetro, à direita (Figuras 1A, 1C). Refere evolução da massa cervical com crescimento lento e progressivo e nega história médica prévia de doenças crônicas, tabagismo e uso contínuo de medicamentos.

Figura 1 - A, B, C e D: Imagens do pré e pós-operatório.

Ao exame físico, observou-se uma massa móvel, indolor à palpação, sem aderência a planos profundos, sem indicativos de invasão a tecidos adjacentes e sem complicações por sinais flogísticos. Ao exame ultrassonográfico de região cervical realizado previamente à consulta, constatou-se a presença de nodulação ecogênica na região cervical direita, que mediu 6,69cm.

Foi realizado procedimento cirúrgico de excisão de lesão, por meio de incisão transversa em região cervical, com cerca de 5cm, conforme orientação das linhas de Langer. Prosseguiuse com dissecção tecidual por planos (Figura 2) e ressecção de massa cervical cística de aspecto cisto-seroso. O ramo mandibular do nervo facial foi identificado e preservado durante a intervenção. Finalizado com síntese cirúrgica, por planos, e colocação de dreno Penrose de número 2 no sítio operatório, com saída externa à ferida operatória.

Figura 2 - Imagem transoperatória de exérese de cisto do segundo arco branquial, via incisão cervical.

Paciente evoluiu bem clinicamente e com recuperação progressiva. O dreno foi retirado com cinco dias de pós-operatório. Após o procedimento, a paciente apresentou paraparesia no canto direito da boca. O músculo depressor do ângulo da boca à direita com força reduzida ao contralateral. Realizada simetrização com aplicação de 2 unidades em 1 ponto de toxina botulínica no músculo contralateral e complementado com fisioterapia motora.

Paciente foi monitorada nos 5º, 10º, 15º, 30º, 45º, 90º dias e 6 meses pós-operatório. Evoluiu com melhora progressiva de paraparesia e de edema local (Figuras 1B, 1D).

O resultado do exame anatomopatológico foi compatível com descrições de cisto do segundo arco branquial - estrutura cística, medindo 6,0 x 5,5 x 4,5cm, que à secção apresenta conteúdo amarelado e seroso.

DISCUSSÃO

As anomalias de arco branquial geralmente são relatadas na infância ou adolescência, mas podem ser diagnosticadas pela primeira vez em qualquer idade. Os tratos sinusais ou fístulas tendem a ser diagnosticados mais cedo devido ao contato com a pele e possível drenagem ou infecção. A idade média de diagnóstico de fístula e trato sinusal é de 2,6 e 3,6 anos, respectivamente. A idade média de diagnóstico para cistos branquiais é de 4,1 anos4,5. A paciente do caso supracitado apresentava 24 anos até o momento do diagnóstico e retirada cirúrgica total da lesão.

Estima-se que até 95% dos casos de malformações do aparato branquial são derivados do segundo arco branquial, os quais podem ocorrer em qualquer área entre o terço anterior do músculo esternocleidomastóideo e a fossa tonsilar. O diagnóstico é por meio de análise clínica e pode ser auxiliado por avaliação radiológica para exclusão de possíveis diagnósticos diferenciais3,6. No caso ressaltado, a paciente apresentava abaulamento importante na porção lateral direita do pescoço - quadro compatível com malformações do aparato branquial - e exame ultrassonográfico que evidenciava nodulação em região cervical, sem indícios de complicações locais e comprometimento de estruturas vasculares e nervosas.

De forma geral, não apresentam importante predominância de sexo ou lado de ocorrência7. O mecanismo fisiopatológico da formação do BCC geralmente resulta da obliteração incompleta das fendas branquiais, com subsequente formação de cistos e fístulas2. Os cistos apresentam revestimento epitelial sem aberturas externas, enquanto as fístulas da fenda branquial são verdadeiras comunicações que conectam a faringe ou a laringe à pele externa e que podem drenar secreção mucosa7,8. No relato citado, o quadro clínico presente era correspondente à apresentação cística de BCC, sem complicações evidentes e sem drenagem de conteúdo mucoso.

O exame ultrassonográfico geralmente mostra um cisto bem circunscrito. No entanto, há variabilidade na aparência ultrassonográfica dos BCC de segundo arco quando há infecção secundária ou quando septos ou detritos celulares estão presentes dentro do cisto, resultando em uma aparência pseudossólida ou heterogênea9. O ultrassom cervical realizado no caso constatou nodulação ecogênica, bem delimitada, na região cervical à direita, sem indícios de presença de infecção associada ao cisto.

A tomografia computadorizada auxilia no diagnóstico e estudo topográfico da lesão e suas relações com estruturas cervicais vasculares e nervosas importantes, porém não é essencial3. No contexto relatado, não foi realizado exame tomográfico, visto que a apresentação clínica e ultrassonográfica não eram compatíveis a sinais de alerta para malignidade e comprometimento de estruturas importantes, evidenciado pela a ausência de aderência a planos profundos e de infiltração de tecidos adjacentes da lesão.

As anomalias do segundo arco branquial devem ser consideradas como um dos possíveis diagnósticos diferenciais de massas cervicais, especialmente as que se manifestam como abaulamento em região lateral do pescoço. Ademais, ressalta-se a alta taxa de diagnósticos clínicos equivocados, sobretudo em relação aos cistos e fístulas branquiais, o que torna evidente que essas alterações são constantemente negligenciadas em relação aos diagnósticos diferenciais4,9.

Além disso, destaca-se que o tratamento é cirúrgico, com a excisão completa da lesão, usualmente por meio de uma incisão cervical transversa e cuidadosa dissecação das estruturas, com o objetivo de extirpar toda a lesão3. Dessa forma, foi a abordagem terapêutica de escolha no caso relato, a qual foi seguida de análise anatomopatológica do cisto extirpado, que confirmou a compatibilidade com cisto do aparelho branquial. Ademais, também pode ser feita uma abordagem transcervical assistida por endoscópio, que apresenta menor tamanho na incisão10. Estudos sobre procedimentos menos invasivos para várias anomalias são promissores, incluindo escleroterapia e excisão endoscópica do BCC de segundo arco11.

Por fim, o BCC de segundo arco é um dos diagnósticos diferenciais de massas na região cervical, e muito frequentemente é subdiagnosticado, além de que, na população adulta, os cistos branquiais são um desafio pela possibilidade de metástase cística de carcinoma oculto1,11. Logo, é de suma importância que o cirurgião saiba identificá-lo, a fim de evitar diagnósticos incorretos e para promover o manejo adequado do paciente.

CONCLUSÃO

Como observado, o cisto branquial é o subtipo mais prevalente de malformações do segundo arco branquial, sendo um importante diagnóstico diferencial de massas na região cervical. O tratamento de escolha é a excisão cirúrgica, sendo uma opção para a extirpação dessa deformidade por fornecer um resultado estético adequado e com altas taxas de resolutividade, apresentando baixos índices tanto de recorrências quanto de complicações.

REFERÊNCIAS

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1. Universidade de Passo Fundo, Passo Fundo, RS, Brasil

Autor correspondente: Eduardo Madalosso Zanin Rua Uruguai, 1932, 3º andar, Passo Fundo, RS, Brasil, CEP: 99010-112, E-mail: eduardo.zanin@gmail.com

Artigo submetido: 09/07/2023.
Artigo aceito: 23/10/2023.

Conflitos de interesse: não há.

 

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