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Case Report - Year2024 - Volume39 - Issue 1

http://www.dx.doi.org/10.5935/2177-1235.2024RBCP0876-PT

RESUMO

Introdução: O carcinoma basocelular (CBC) de vulva é uma condição rara que corresponde a menos de 0,4% dos casos de CBC e de 2% a 4% das neoplasias de vulva. O CBC de vulva é mais comum entre mulheres brancas, multíparas e na pósmenopausa, especialmente na sétima década de vida. O objetivo é relatar um caso de CBC de vulva no qual discutiram-se os aspectos do diagnóstico e tratamento.
Relato de Caso: Mulher de 63 anos de idade, G1P1A0, chega ao consultório em janeiro de 2022 para tratamento de lesão persistente em vulva. Realizou-se biópsia incisional que mostrou tratar-se de provável carcinoma basocelular nodular com invasão da derme. A paciente submeteu-se a uma ressecção do tumor com margens macroscópicas livres e sutura primária. A cirurgia não teve complicações no pré-operatório e no pós-operatório. O histopatológico da peça cirúrgica mostrou tratar-se de carcinoma basocelular nodular com área irregular, plana, branco, medindo 0,7x0,4cm, com as margens laterais distando 7,0 e 5,0mm e profundas, 5,9mm; todas livres.
Conclusão: O caso relatado é raro, tendo sido o tratamento de ressecção cirúrgica do CBC de vulva com margens bem-sucedido. Catorze meses após a cirurgia, a paciente encontra-se sem evidências de recidiva local ou regional.

Palavras-chave: Neoplasias cutâneas; Carcinoma basocelular; Vulva; Diagnóstico diferencial; Relatos de casos

ABSTRACT

Introduction: Basal cell carcinoma (BCC) of the vulva is a rare condition that accounts for less than 0.4% of BCC cases and 2% to 4% of vulvar neoplasms. BCC of the vulva is more common among white, multiparous, and postmenopausal women, especially in the seventh decade of life. The objective is to report a case of BCC of the vulva in which aspects of diagnosis and treatment were discussed.
Case Report: A 63-year-old woman, G1P1A0, arrives at the office in January 2022 for treatment of a persistent lesion on her vulva. An incisional biopsy was performed which showed that it was likely nodular basal cell carcinoma with invasion of the dermis. The patient underwent tumor resection with free macroscopic margins and primary suture. The surgery had no complications preoperatively or postoperatively. The histopathology of the surgical specimen showed that it was a nodular basal cell carcinoma with an irregular, flat, white area, measuring 0.7x0.4cm, with the lateral margins 7.0 and 5.0mm apart and deep, 5.9mm; all free.
Conclusion: The reported case is rare, with surgical resection of BCC of the vulva with margins being successful. Fourteen months after surgery, the patient has no evidence of local or regional recurrence.

Keywords: Skin neoplasms; Carcinoma, basal cell; Vulva; Diagnosis, differential; Case reports


INTRODUÇÃO

O carcinoma basocelular (CBC) de vulva é uma condição rara, pois representa menos de 0,4% de todos os casos de CBC e de 2% a 4% das neoplasias de vulva. Estima-se que, anualmente, ocorram cerca de 6.190 casos no mundo e prevê-se um crescimento de 4,6% no número de casos a cada 5 anos. A maior prevalência ocorre em mulheres brancas, multíparas e na pós-menopausa, especialmente na sétima década de vida, sendo, portanto, a idade avançada um fator de risco, mas pode ocorrer também em pacientes jovens1,2.

Em relação à apresentação clínica, as lesões podem variar desde pápulas ou placas solitárias de coloração rósea-avermelhada nos grandes lábios até lesões bilaterais, múltiplas, e nas fases avançadas ocorre ulceração. Quanto à etiologia, uma vez que a região acometida está localizada em uma área protegida da radiação solar, possivelmente há associação com os seguintes fatores: inflamação crônica, exposição à radiação ionizante e ao arsênico, imunossupressão, radiação pélvica ou trauma; ou seja, danos que não se relacionam com radiação ultravioleta, mas que também podem gerar mutações. Logo, é importante fazer a pesquisa de condições secundárias como líquen escleroso, síndrome nevoide e doença de Paget, uma vez que existem casos documentados na literatura de CBC nestas doenças2.

Os sintomas são inespecíficos e incluem prurido, dor, ulcerações e sangramentos. Estes fazem parte de um quadro com apresentação clínica tardia e variável, sendo, pois, fatores que podem atrasar o diagnóstico e o tratamento. O tipo mais comum é o nodular, em detrimento de outras variantes mais raras como o superficial, o infiltrativo e o misto3.

A dermatoscopia apresenta características semelhantes às de outros sítios: ninhos ovais de coloração cinza-azulada, telangiectasias arborizantes, e estruturas em formato de folha com áreas claras brilhantes e ulceração4. O tratamento é cirúrgico, mas a recidiva pode ocorrer devido ao fato de as bordas do tumor não serem facilmente bem delineadas, dificultando a obtenção de margens cirúrgicas livres e aumentando as chances de realizar excisões incompletas5,6.

OBJETIVO

O objetivo do estudo foi relatar um caso de CBC de vulva no qual discutiu-se os aspectos do diagnóstico e tratamento.

RELATO DE CASO

Uma mulher de 63 anos de idade, G1P1A0, apresentou-se ao consultório, em Teresina, PI, em janeiro de 2022 para tratamento de uma lesão persistente na vulva. Ela percebeu a presença do nódulo após um pelo encravado persistir em vigência de depilação no local. Sua história pregressa incluía hipertensão arterial sistêmica e uma histerectomia total abdominal, com preservação dos ovários, feita no ano de 2006 devido mioma sintomático e tabagismo há cerca de 30 anos.

O exame ginecológico revelou uma tumoração elevada no terço superior do grande lábio à esquerda, medindo cerca de 1,0x0,8cm, sem ulceração e bordas levemente irregulares, além de ausência de linfadenopatia inguinal suspeita ao exame clínico e ultrassonográfico (Figura 1).

Figura 1 - Lesão em vulva apresentada pela paciente.

Uma ultrassonografia transvaginal e uma vulvoscopia foram indicadas. Identificouse, respectivamente, pequeno cisto simples no ovário esquerdo e lesão hipercrômica de superfície lisa no grande lábio esquerdo, suspeita de neoplasia. O histopatológico do material da biópsia incisional da lesão (Figura 2) mostrou tratar-se de provável carcinoma basocelular nodular, com invasão da derme e sem invasão perineural.

Figura 2 - Histopatológico da biópsia incisional (aumento: 100x).

A paciente submeteu-se a uma ressecção do tumor da vulva com margens macroscópicas livres e sutura primária. Na cirurgia, não houve complicações e a alta foi obtida após uma noite após o procedimento. No pós-operatório imediato e tardio, também não ocorreram intercorrências, como deiscência e/ou inflamação. O histopatológico da peça cirúrgica (Figura 3) mostrou um carcinoma basocelular nodular com área irregular, plana, branco, medindo 0,7x0,4cm, com as margens laterais distando 7,0 e 5,0mm e as profundas, 5,9 mm; todas livres. A paciente, 14 meses após a cirurgia, encontra-se sem evidência de recorrência local ou regional.

Figura 3 - Histopatológico da peça cirúrgica (aumento: 400x).

O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Estadual do Piauí (CEPUESPI), Parecer No 4.311.835/2020. A paciente assinou o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) para a publicação do caso.

DISCUSSÃO

Atualmente, algumas técnicas como a utilização do dermatoscópio e da microscopia refletiva confocal estão sendo apontadas como vantagens diagnósticas no contexto do CBC. Isso porque proporcionam a visualização de características inerentes ao CBC, como telangiectasias lineares, veias arborizantes e ninhos de células cinza azuladas ovais, além de estruturas peroladas7,8. No presente caso, como a principal suspeita se tratava de neoplasia pela vulvoscopia, optou-se pela realização da biópsia através de punch. Ressalta-se que, quanto mais tardio o diagnóstico, maiores as chances de cirurgias mutiladoras que comprometem a qualidade de vida da paciente.

Ainda segundo validação em série de casos recentes, o local mais afetado pelo CBC de vulva são os lábios maiores, em cerca de 90% dos casos, e a média de idade das mulheres acometidas é de 71,9 anos, sendo a etnia mais afetada a caucasiana. Assim como o exposto, nossa paciente se encontra dentro do intervalo de idade mais frequentemente acometido pelo CBC de vulva, e o local afetado foi considerado o mais frequente na literatura (grandes lábios), apesar de existirem casos em que a lesão se localiza no clitóris, no lábio menor, no períneo e no introito vaginal1.

Os sintomas iniciais podem ser somente pruridos ou lesões superficiais inespecíficas, no entanto, se não for diagnosticada e tratada adequadamente podem evoluir para ulceração, sangramento e dor, uma vez que o câncer na vulva pode ter um comportamento mais agressivo do que o de áreas fotoexpostas, com mais invasão perineural e infiltração local. É válido ressaltar que pacientes com a síndrome do nevo basocelular, ou seja, mutação no gene PTCH têm mais propensão a desenvolver a doença e necessitam de exames de pele regulares como seguimento.

Quanto aos tipos, os CBC mais comuns são os tipos nodulares, seguido pelos superficiais. Geralmente, não há necessidade de abordagem linfonodal, pois o acometimento metastático é raro. A linfadenectomia inguinal só é indicada na presença de metástase linfonodal clinicamente evidente. O CBC é uma entidade de crescimento indolente e de baixa propensão a metástases. Estudos de imagem são reservados para casos avançados para avaliar o envolvimento de estruturas adjacentes e ajudar na programação cirúrgica8.

O diagnóstico é feito por biópsia com auxílio da análise histopatológica por meio dos corantes hematoxilina e eosina ou a detecção de marcadores típicos por imuno-histoquímica, com o CK20 sendo o mais indicado, que não foi realizada em nosso caso pelo caráter mais morfológico dos achados, podendo gerar questionamento, e sendo mais utilizada com finalidade acadêmica. A apresentação pode confundir com outras doenças, como psoríase, dermatite, líquen escleroso, neoplasias intraepiteliais vulvares e doença de Paget1,3.

Com relação ao desenvolvimento do câncer, os genes p53 e BCL2 estão envolvidos, participando da regulação do ciclo celular. Já os marcadores ki- 67 e PCNA estão ligados à predisposição ao câncer. Mutações no P53 podem levar à malignização de lesões preexistentes e no BCL2 à imortalização da célula. Quanto ao marcador PCNA, não foi utilizado no nosso caso porque é resguardado para identificar lesões relacionadas a luz UV, sendo o presente caso localizado em uma área não fotoexposta. Já o ki-67 confere informação prognóstica sobre o tumor, não sendo utilizado no nosso caso por se tratar de uma lesão não ulcerada e sem sinais de gravidade9.

Como tratamento pode ser realizado aplicação tópica de imiquimode a 5%, crioterapia, curetagem ou excisão local ampla, incluindo também mais recentemente a técnica de Mohs, com menores índices de recorrência local associados, um problema mais bem relacionado com localização, e não com o tamanho da lesão.

É válido ressaltar que não existem guidelines que corroborem a superioridade de qualquer técnica no tratamento desses tumores e as taxas de recorrência podem chegar a 20%, apesar de alguns autores sugerirem a abordagem cirúrgica por excisão com margens livres como efetiva. A terapia sistêmica pode ser recomendada em casos de margens positivas, metástases e casos avançados, sendo o vismodegib uma excelente opção (inibidor da sinalização HH)6,10.

CONCLUSÃO

O caso relatado de CBC de vulva em mulher na pós-menopausa de 63 anos de idade com história de lesão vulvar após inflamação crônica do local não fotoexposto é raro, tendo sido o tratamento realizado por meio de ressecção cirúrgica do tumor com margens. Em 14 meses de seguimento pós-cirurgia, a paciente encontra-se sem evidências de recidiva local ou regional.

REFERÊNCIAS

1. Asilian A, Moeine R, Hafezi H, Shahriarirad R. Treatment of vulvar basal cell carcinoma with Slow-Mohs micrographic surgery A case report. Clin Case Rep. 2022;10(10):e6442.

2. Tan A, Bieber AK, Stein JA, Pomeranz MK. Diagnosis and management of vulvar cancer: A review. J Am Acad Dermatol. 2019;81(6):1387-96.

3. Rudd JC, Li C, Hajiannasab R, Khandalavala J, Sharma P. Diagnosing Basal Cell Carcinoma of the Vulva: A Case Report and Review of the Literature. Cureus. 2021;13(12):e20791.

4. Renati S, Henderson C, Aluko A, Burgin S. Basal cell carcinoma of the vulva: a case report and systematic review of the literature. Int J Dermatol. 2019;58(8):892-902.

5. Kumar N, Ray MD, Sharma DN, Pandey R, Lata K, Mishra A, et al. Vulvar cancer: surgical management and survival trends in a low resource setting. J Egypt Natl Canc Inst. 2020;32(1):4.

6. Sinha K, Abdul-Wahab A, Calonje E, Craythorne E, Lewis FM. Basal cell carcinoma of the vulva: treatment with Mohs micrographic surgery. Clin Exp Dermatol. 2019;44(6):651-3.

7. Dalton AK, Wan KM, Gomes D, Wyatt JM, Oehler MK. Inguinal Metastasis from Basal Cell Carcinoma of the Vulva. Case Rep Oncol. 2019;12(2):573-80.

8. Wohlmuth C, Wohlmuth-Wieser I. Vulvar malignancies: an interdisciplinary perspective. J Dtsch Dermatol Ges. 2019;17(12):1257-76.

9. Flipo R, Bani MA, Rejaibi S, Talhi N, Sastre-Garau X. Vulvar Basal Cell Carcinoma: Clinical and Histopathologic Features. Int J Gynecol Pathol. 2022;41(1):86-92.

10. Choi HY, Roh MS, Park JW. Vulvar Basal Cell Carcinoma in Postmenopausal Women: Two Case Reports. J Menopausal Med. 2023;29(1):40-3.











1. Universidade Estadual do Piauí, Centro de Ciências da Saúde, Teresina, Piauí, Brasil
2. Centro Universitário Uninovafapi, Teresina, Piauí, Brasil
3. Medimagem, Teresina, Piauí, Brasil
4. Oncocenter, Teresina, Piauí, Brasil

Autor correspondente: Rafael Everton Assunção Ribeiro da Costa Rua Olavo Bilac 2335, Centro (Sul), Teresina, PI, Brasil. CEP: 64001-280, E-mail: rafaelearcosta@gmail.com

Artigo submetido: 18/09/2023.
Artigo aceito: 05/12/2023.

Conflitos de interesse: não há.

 

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