ISSN Online: 2177-1235 | ISSN Print: 1983-5175

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Original Article - Year2008 - Volume23 - Issue 3

RESUMO

Introdução: O retalho miocutâneo transverso do reto abdominal (TRAM) constitui-se a opção cirúrgica de eleição nas reconstruções mamárias com tecidos autógenos, porém o seroma na área doadora do retalho ainda apresenta-se como uma complicação freqüente. Método: Neste estudo prospectivo de 20 pacientes com câncer de mama (T1 e T2) submetidas a reconstrução com TRAM mais tela cirúrgica sintética não-absorvível (polipropileno), os autores avaliaram a eficácia dos pontos de adesão na eliminação do seroma quando empregados no retalho cutâneo abdominal. Conclusão: Concluiu-se ser esse método uma maneira efetiva de eliminar a formação de seroma e excluir a necessidade de dreno de sucção abdominal.

Palavras-chave: Retalhos cirúrgicos. Seroma. Mamoplastia. Procedimentos cirúrgicos reconstrutivos.

ABSTRACT

Introduction: The TRAM flap in breast reconstruction is the best surgery technique when using autogenous tissue although the seroma's formation at abdominal donor site area still remains a problem to be solved. Methods: In this prospective study, 20 patients with T1 to T2 breast cancer were submitted to immediate breast reconstruction with TRAM flap plus prolene mesh at abdominal donor site area. The authors had evaluated the quilting suture's efficiency to prevent seroma after breast reconstruction and the role of suction drainage when combined with quilting sutures to prevent seroma's formation at donor site area.

Keywords: Surgical flaps. Seroma. Mammaplasty. Reconstructive surgical procedures.


INTRODUÇÃO

Desde sua sistematização por Hartrampf et al., em 1982, o retalho miocutâneo transverso de reto abdominal (TRAM) é a opção cirúrgica de escolha na reconstrução mamária com tecido autólogo em pacientes submetidas a mastectomia por carcinoma mamário, principalmente naquelas com indicação de radioterapia adjuvante, nas quais o emprego das técnicas de reconstrução com implante de silicone é prejudicado, em decorrência de elevados índices de fibrose local e contratura capsular1.

A incidência de seroma, uma complicação freqüente na área doadora do retalho abdominal, é proporcional à extensão do descolamento, o qual resulta em espaço morto e permite o deslizamento do retalho cutâneo da parede abdominal à musculatura subjacente, determinando aumento de morbidade cirúrgica, tais como infecção, deiscência da ferida e punções repetidas.

A drenagem fechada previne adequadamente a formação de hematoma, nos primeiros dias de pós-operatório, porém não evita a formação de seroma, podendo inclusive aumentar a produção do mesmo2.

O uso da técnica de adesão dos retalhos descolados proposto por Baroudi e Ferreira3, fixando primariamente o retalho cutâneo da área doadora à aponeurose da parede abdominal nas abdominoplastias, tornou dispensável a drenagem, mostrando-se eficaz na redução de seroma.

Nas reconstruções mamárias com TRAM, a dissecação do retalho é similar às abdominoplastias, diferindo pela necessidade do uso de tela cirúrgica sintética não-absorvível (polipropileno) no fechamento da bainha do músculo reto e também produz espaço morto semelhante ao observado na área doadora do retalho latíssimo do dorso.

Este estudo foi realizado com o propósito de avaliar os efeitos dos pontos de adesão na eliminação do seroma da área doadora, suprimindo a utilização de drenos de sucção no abdome, nas reconstruções mamárias com retalho miocutâneo do reto abdominal e uso de tela sintética.


MÉTODO

A partir de março de 2006, 20 pacientes submetidas a mastectomia e candidatas à reconstrução mamária com TRAM foram incluídas de forma randomizada neste estudo prospectivo.

A idade das pacientes variou de 31 a 63 anos (média de 47,7 anos) e o índice de massa corporal de 21,9 kg/m2 a 29,7 kg/m2 (média de 26,69 kg/m2).

As reconstruções foram realizadas pela mesma equipe cirúrgica, na mesma unidade hospitalar, em pacientes oriundos do Serviço Único de Saúde (SUS) e clientela privada.

Todas as reconstruções foram imediatas, com retalho TRAM monopediculado, ipisilateral e sob anestesia geral, com marcação cutânea da área doadora do retalho, como descrito por Bezerra e Moura4 (Figuras 1 a 3). A exposição da camada músculo aponeurótica estendeu-se da incisão supra-umbilical às margens costais e além do apêndice xifóide. A elevação de ambos os retalhos, TRAM e abdominal, foi realizada com eletrocautério. Após transposição do retalho, realizou-se o fechamento da parede abdominal com síntese primária das camadas aponeuróticas acima da linha arqueada de Douglas e aposição de tela cirúrgica sintética não-absorvível (polipropileno) inferiormente à linha arqueada, fixada com fio mononylon 2-0. A seguir, procedeu-se à fixação do retalho abdominal à aponeurose com pontos de adesão, iniciando-se ao nível do epigástrio, prosseguindo caudalmente até a borda da ferida na linha púbica, com cerca de 5 cm entre os pontos, utilizando fio 2-0, poliglatina 910 (Figuras 4 e 5). Não foram utilizados quaisquer tipos de drenos. A cicatriz umbilical foi reposicionada e completou-se a síntese por planos da incisão abdominal (Figuras 6 e 7).


Figura 1 - Decúbito dorsal com marcação inicial do abdome - lado direito.


Figura 2 - Marcação do abdome - papel de luva sobre marcação prévia.


Figura 3 - Marcação final do abdome - rotação para lado oposto.


Figura 4 - Retalho abdominal elevado - início dos pontos de adesão (PA), cicatriz umbilical (U), tela cirúrgica sintética não-absorvível (TS).


Figura 5 - Continuação dos pontos de adesão (PA).


Figura 6 - Término dos pontos de adesão (PA) até borda da incisão.


Figura 7 - Resultado final após o fechamento das áreas doadora e receptora, sem dreno de sucção.



As pacientes foram avaliadas diariamente em busca de sinais e/ou sintomas que evidenciassem coleções na parede abdominal, permanecendo no hospital por cerca de 48 horas e sendo orientadas a deambular após o primeiro dia de cirurgia. Foram acompanhadas em regime ambulatorial por 30 dias e, no caso de suspeita de seroma, solicitou-se ultra-sonografia da parede abdominal. A presença de seroma foi definida como acúmulo de soro estéril semelhante a tumor em uma cavidade5.


RESULTADOS

Das 20 pacientes avaliadas neste estudo, nenhuma apresentou relato ou evidências ao exame clínico de seromas ou qualquer outra coleção na camada supra-aponeurótica, no pós-operatório imediato ou no acompanhamento por trinta dias.


DISCUSSÃO

A mobilização do retalho TRAM exige um amplo descolamento do retalho cutâneo da parede abdominal com interrupção dos canais linfáticos e vasculares e liberação de mediadores inflamatórios, resultando em espaço morto e deslizamento entre o retalho cutâneo abdominal e a aponeurose muscular, determinando freqüentemente a formação de seroma (9,4%)6 na área doadora abdominal.

A utilização de drenos de sucção é indicada na presença de espaço morto e o seu uso pode evitar a formação de hematomas2 nos primeiros dias pós-operatórios, mas ainda há formação de seromas depois que os drenos são removidos, mesmo obedecendo-se os critérios de volume mínimo de líquido coletado (30ml/24h) antes da retirada7. A manutenção de drenos por um longo período de tempo causa desconforto ao paciente, prolonga a internação hospitalar, diminui a deambulação precoce, aumentando os riscos de fenômenos tromboembólicos, altera a cicatrização por aumento da pressão local, com surgimento de deiscências e necroses da ferida cirúrgica.

Comumente detectados durante a 2ª semana de pós-operatório e diagnosticados pelos relatos das pacientes de abaulamento no abdome inferior associado a episódios febris vespertinos e pela evidência ao exame físico de sinais inflamatórios no retalho abdominal ou pela aspiração com agulha, os seromas, que deveriam ser autolimitados, tendem a tornarem-se recorrentes, necessitando de aspirações repetidas que tornam a área fibrosa, dura, com aspecto de "casca de laranja"8.

Nas abdominoplastias, um método eficaz na eliminação do seroma e, conseqüentemente, do uso de dreno de sucção é o emprego da técnica de adesão dos retalhos descolados descritos inicialmente por Baroudi e Ferreira3,8, com seus benefícios reiterados por Nahas et al.2, Pollock et al.9, Roje et al.10. Quanto à eficácia do emprego da técnica de adesão dos retalhos descolados na eliminação da formação de seroma em área doadora de retalhos miocutâneos nas reconstruções, Titley et al.11 relatam redução da incidência de formação de seroma com pontos de adesão no fechamento da área doadora do retalho do músculo latíssimo do dorso, fato este corroborado por Rios et al.12, Daltrey et al.13 e Bezerra e Moura14.

A dissecação do retalho TRAM é similar à abdominoplastia estética quanto à elevação do retalho cutâneo abdominal, com a exceção da colocação de tela cirúrgica sintética não-absorvível (polipropileno) no fechamento da bainha do músculo reto, como também a produção de espaço morto semelhante ao observado na área doadora do retalho latíssimo do dorso.

McCarthy et al.6 avaliaram um grupo de pacientes submetidas a reconstrução mamária com retalho TRAM pediculado e fechamento da parede abdominal com tela sintética e pontos de adesão, com redução do volume drenado, menor incidência de formação de seroma, mas sem diferença significativa no tempo de remoção do dreno no grupo com pontos de adesão quando comparado ao grupo com fechamento padrão da parede abdominal. Concluíram ser um método eficaz na prevenção de seroma, porém devido ao pequeno número de pontos de adesão empregados (onze) recomendaram posteriores estudos com maior número de pontos de adesão. Scevola et al.15 verificaram se o número de drenos influenciava a formação de seroma, analisando 768 reconstruções mamárias com retalho TRAM, e deduziram que a incidência de seroma é menor com o uso de dois drenos.

Neste estudo prospectivo, 20 pacientes submetidas a reconstrução mamária unilateral imediata com retalho TRAM monopediculado, ipisilateral, foram avaliadas. Após transposição do retalho TRAM para o tórax e sínteses das aponeuroses acima da linha arqueada de Douglas e aposição de tela cirúrgica sintética não-absorvível (polipropileno) inferiormente à linha arqueada, fixada com fio mononylon 2-0, empregou-se a técnica de adesão dos retalhos descolados fixando o retalho abdominal à aponeurose do músculo reto abdominal com cerca de 5 cm entre os pontos, utilizando fio 2-0, poliglatina 910. Na região da tela sintética, não são colocados pontos de adesão no retalho cutâneo, fato este que poderia diminuir a efetividade do método na eliminação do seroma.

O tempo cirúrgico da reconstrução aumentou em cerca de 30 minutos, sem que isto implicasse em prejuízos a paciente, pois há compensação pelo ganho de tempo empregando o molde de Bezerra e Moura4.

Nenhum dreno de sucção foi utilizado e as pacientes foram avaliadas até a alta hospitalar e semanalmente por 30 dias, por exame físico geral e do abdome em busca de evidências de coleções na parede abdominal e, no caso de suspeita clínica, ultra-sonografia foi realizada, sem confirmação de seromas.

Assim, acredita-se que a técnica de adesão dos retalhos descolados é válida na tentativa de ocluir o espaço morto e evitar a formação de seroma abdominal, dispensando, portanto, a utilização de drenos de sucção no abdome quando das reconstruções mamárias com retalho miocutâneo do reto abdominal mais emprego de tela sintética em pacientes mastectomizadas. Trata-se uma técnica de fácil curva de aprendizado, não demandando instrumento ou equipamento especiais.


CONCLUSÕES

Concluiu-se que os pontos de adesão nos retalhos descolados na área doadora do retalho TRAM diminuem a formação de seroma, mesmo sem fixação do retalho cutâneo na região da tela sintética não-absorvível, tornando desnecessário o uso de dreno de sucção no abdome.


REFERÊNCIAS

1. Stuart SR, Maia MAC. Radioterapia mamária. In: Mélega JM, Montoro AF, Albertoni WM, eds. Cirurgia plástica fundamentos e arte - cirurgia reparadora de tronco e membros. 1ª ed. Rio de Janeiro:MEDSI;2004. p.92-6.

2. Nahas FX, Ferreira LM, Ghelfond C. Does quilting suture prevent seroma in abdominoplasty? Plast Reconstr Surg. 2007;119(3):1060-6.

3. Baroudi R, Ferreira CA. Contouring the hip and the abdomen. Clin Plast Surg. 1996;23(4):551-73.

4. Bezerra FF, Moura RM. A simple template to improve preoperative marking in abdominoplasty. Plast Reconstr Surg. 2007;119(3):1142.

5. Seroma. Disponível em: www.bireme.br. Acesso em: maio de 2007.

6. McCarthy C, Lennox P, Germann E, Clugston P. Use of abdominal quilting sutures for seroma prevention in TRAM flap reconstruction: a prospective, controlled trial. Ann Plast Surg. 2005;54(4):361-4.

7. Nurkim MV, Mendonça LB, Martins PAM, Silva JLB, Martins PDE. Incidence of hematoma and seroma in abdominoplasty with and without the use of drains. Rev Soc Bras Cir Plast. 1986;17(1):69-71.

8. Baroudi R, Ferreira CAA. Seroma: how to avoid it and how to treat it. Aesthetic Surg J. 1998;18(6):439-41.

9. Pollock H, Pollock T. Progressive tension sutures: a technique to reduce local complications in abdominoplasty. Plast Reconstr Surg. 2000;105(7):2583-8.

10. Roje Z, Roje Z, Karanovic N, Utrobicic I. Abdominoplasty complications: a comprehensive approach for the treatment of chronic seroma with pseudobursa. Aesthetic Plast Surg. 2006;30(5):611-5.

11. Titley OG, Spyrou GE, Fatah MF. Preventing seroma in the latissimus dorsi flap donor site. Br J Surg. 1997;50(2):106-8.

12. Rios JL, Pollock T, Adams WP Jr. Progressive tension sutures to prevent seroma formation after latissimus dorsi harvest. Plast Reconstr Surg. 2003;112(7):1779-83.

13. Daltrey I, Thomson H, Hussien M, Krishna K, Rayter Z, Winters ZE. Randomized clinical trial of the effect of quilting latissimus dorsi flap donor site on seroma formation. Br J Surg. 2006;93(7):825-30.

14. Bezerra FJF, Moura RMG. Utilização da "técnica de Baroudi-Ferreira" no fechamento da área doadora do retalho do músculo latíssimo do dorso. Rev Soc Bras Cir Plast. 2007;(in press).

15. Scevola S, Youssef A, Kroll SS, Langstein H. Drains and seromas in TRAM flap breast reconstruction. Ann Plast Surg. 2002;48(5):511-4.










I. Membro Titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica; Chefe do Serviço de Cirurgia Plástica do Hospital do Câncer do Ceará - Instituto do Câncer do Ceará.
II. Membro Titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica; Cirurgião Plástico do Hospital do Câncer do Ceará - Instituto do Câncer do Ceará.

Correspondência para:
Rosely Moraes Gonçalves de Moura
Rua Rui Monte, 1220 - Bloco 14 - Aptº 401 - Antonio Bezerra
Fortaleza - CE - CEP 60360-640
E-mail: roselymgdemoura@hotmail.com

Trabalho realizado no Hospital do Câncer do Ceará - Instituto do Câncer do Ceará, Fortaleza, CE. Trabalho apresentado no Congresso Brasileiro de Cirurgia Plástica (Curitiba - PR - 2007) no exame para ascensão a Membro Titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica.

Artigo recebido: 23/06/2008 Artigo aceito: 12/08/2008

 

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