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Case Report - Year2014 - Volume29 - Issue 3

http://www.dx.doi.org/10.5935/2177-1235.2014RBCP0060

RESUMO

INTRODUÇÃO: A fístula palatina é a complicação mais frequente após palatoplastias e sua presença traz diversas implicações. Sua apresentação é diversificada e seu reparo pode ser difícil, o que se traduz na existência de uma diversidade de técnicas cirúrgicas descritas.
OBJETIVO: Relatar a correção cirúrgica de fístula palatina anterior com retalho miomucoso labial superior, além de fazer uma breve revisão da literatura.
RELATO DE CASO: Paciente submetido à correção de fissura palatina completa, apresentando, no pós-operatório mediato, fístula anterior de palato duro e processo alveolar, submetido à correção da fístula palatina oronasal com retalho miomucoso de lábio superior. O paciente evoluiu satisfatoriamente, sem complicações e sem recidiva da lesão após um ano de seguimento.
CONCLUSÃO: A técnica em questão mostrou-se simples e eficiente, prestando-se à correção da fístula palatal anterior.

Palavras-chave: Palatoplastia/complicações; Fístula palatina; Retalho miomucoso labial superior.

ABSTRACT

INTRODUCTION: Palatal fistula is the most common complication after palatoplasty, and its presence entails various implications. Its presentation is diverse and repair can be difficult, which is reflected in the existence of a numerous surgical techniques described for its treatment.
OBJECTIVE: To report the surgical correction of palatal fistula with a myomucosal upper lip flap, along with a brief review of the literature.
CASE REPORT: The patient underwent repair of complete cleft palate. At the immediate postoperative time, an anterior fistula of the hard palate and alveolar process was present and was subjected to a correction with an oronasal myomucosal upper lip flap. The patient progressed satisfactorily, without complications or lesion recurrence after 1 year of follow-up.
CONCLUSION: The technique presented is a simple and efficient method for correction of an anterior palatal fistula.

Keywords: Palatoplasty/complications; Palatal fistula; Myomucosal upper lip flap.


INTRODUÇÃO

As fissuras labiopalatais são más formações congênitas, cuja incidência é variável em nosso país; porém, é estimada em cerca de 1:650 nascidos vivos1, adquirindo, portanto, importância em termos de saúde pública.

O defeito mais comum no palato duro após o seu reparo cirúrgico é a fístula2 As fístulas ocorrem mais frequentemente após palatoplastias por fendas completas do palato primário e secundário do que por uma fenda isolada do palato secundário. As fístulas são causadas por infecção, formação de hematoma entre as camadas mucosas oral e nasal, tensão excessiva no reparo, espaço morto entre as mucosas e/ou técnica inadequada.

Podem ser classificadas, quanto ao tamanho, em pequenas (até 5 mm - defeitos mínimos habitualmente na linha média e, na sua maioria, assintomáticos); grandes (entre 5 mm e 2 cm - geralmente localizadas na linha média e mais frequentemente no palato duro anterior, são sempre sintomáticas), e gigantes (maiores que 2 cm, podem resultar de necrose distal do retalho e têm, em geral, grande sequestro ósseo). E quanto à sua localização, em: vestibuloalveolares, do palato duro, da junção entre palato duro e mole, e do palato mole3.

As fístulas são geralmente pequenas e se tornam óbvias dentro de poucas semanas após o reparo primário; ocasionalmente, podem resultar de uma expansão ortodôntica dos arcos dentários (na realidade, um alargamento de uma lesão pré-existente). Grandes defeitos que afetam a fala ou permitem o escape de fluidos ou partículas de alimentos sólidos pelo nariz devem ser fechados precocemente. Quando a fístula é pequena e sem significado funcional, o fechamento pode ser postergado por vários anos, se, de fato realizado4.


CASO CLÍNICO

Paciente A.R.S., 38 anos, sexo masculino, faioderma, submetido à correção de fissura palatina completa pela técnica de Veau, evoluiu com fístula grande (1,6 cm × 0,7 cm em seu maior diâmetro), em região anterior de palato duro e processo alveolar (Figura 1), sendo submetido à correção da mesma com retalho miomucoso de lábio superior. Na técnica utilizada, após a marcação, o forro nasal foi reconstruído com a confecção de retalho de vizinhança "em folha de livro" bilateralmente e paralelos ao orifício da fístula, sendo então elevado o retalho labial miomucoso para a correção do defeito palatino (Figura 2). O paciente evoluiu sem complicações ou recidivas durante o seguimento de um ano.


Figura 1. Defeito envolvendo aspecto anterior palato duro e processo alveolar.


Figura 2. Marcação do retalho miomucoso labial superior e aspecto pós-operatório final.



DISCUSSÃO

A fístula palatina é a complicação mais frequente após palatoplastias e sua presença traz diversas implicações. Sua apresentação é diversificada e seu reparo pode ser difícil, o que se traduz na existência de uma diversidade de técnicas descritas. O uso de retalho mucoso labial é antigo e já descrito por Rosenthal em 1917, que descreveu o emprego do retalho de mucosa labial do sulco do lábio superior para fechamento de um grande defeito de palato anterior5. Em 1980, Rintala6, seguido de outros autores, fez uso de um retalho mucoso de lábio para fístulas de palato anterior; porém, tratava-se de um retalho ao acaso, o que limitava seu comprimento. Note-se que, somente em 2006, foi publicada por Tiwari7 uma modificação no retalho, incluindo, no mesmo, parte da musculatura subjacente, tornando-o mais robusto e com melhor vascularização, baseando-se nos ramos terminais da artéria labial superior.

O fechamento de defeitos entre as cavidades oral e nasal devem sempre ser feitos em dois planos8, o que pode ser alcançado mediante diversas técnicas. Embora infrequente, o uso de uma prótese oclusiva pode ser a solução para defeitos que não podem ser fechados com tecidos locais por causa de seu tamanho ou pela preferência do paciente4.

Fístulas de palato anterior têm sido fechadas por métodos convencionais, usando-se tecidos locais, regionais ou à distância9; para defeitos pequenos, são usados, com mais frequência, apenas retalhos em dobradiça ou em conjunto com retalhos de avanço, rotação1 ou em ilha10.

Em grandes fístulas, primeiramente, foi demonstrado um manejo bem sucedido com retalho lingual por Guerro-Santos & Altamirano11. Entretanto, este tem a desvantagem de ser um procedimento em dois tempos, com dificuldades na intubação e na extubação, com risco de perda do retalho pelo movimento da língua e presença de tecido espesso e esteticamente desagradável.

Nas últimas duas décadas, o retalho de bucinador tem sido amplamente usado para o reparo de fenda e fístula palatina, principalmente para defeitos nos terços médio e posterior do palato.

Rintala6 fez uso de um retalho mucoso de lábio para fistulas de palato anterior, porém tratava-se de um retalho ao acaso, o que limitava seu comprimento. O mesmo retalho foi descrito por diversos autores e obras4,12-14. Outro retalho ao acaso do sulco gengivobucal foi usado por Hirshowitz & Mahler15 para defeitos do processo alveolar, em que o canino e o primeiro molar estavam ausentes. Tiwari, em 20067, publicou um artigo mostrando uma modificação no retalho, incluindo, no mesmo, parte da musculatura subjacente, tornando-o mais robusto e com melhor vascularização, baseando-se nos ramos terminais da artéria labial superior.

A técnica do retalho miomucoso de lábio superior está indicada para tratamento de fistulas de palato duro anterior e fistulas vestibuloalveolares com ou sem enxerto ósseo14. A abordagem cirúrgica relatada é executada em um só tempo, não havendo necessidade de seccionar o pedículo que se incorpora ao arco alveolar, além de não trazer prejuízo ao uso futuro de próteses dentárias. Pode ser empregada mesmo em pacientes com dentição completa, nos quais é utilizada uma prótese plástica para proteção do pedículo, a fim de evitar que este seja mordido pelo paciente. Observe-se que, neste caso, é necessário um procedimento em dois tempos.

Por isso e por apresentar adequado arco de rotação e vascularização pela artéria labial superior, este retalho miomucosoapresenta-se como uma excelente opção para as reconstruções das fístulas palatinas anteriores.


CONCLUSÃO

Podemos concluir, pelas diversas formas e apresentações das fistulas palatinas, que é de suma importância um arsenal diversificado de técnicas para sua correção. A técnica em questão mostrou-se simples e eficiente, prestando-se à correção da fístula palatina anterior.


REFERÊNCIAS

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2. Stal S, Spira M. Secondary reconstructive procedures for patients with clefts. In: Serafin D, Georgiade NG, editors. Pediatric plastic Surgery. St. Louis: C. V. Mosby; 1984. p. 352-77.

3. Carreirão S, Lessa S, Zanini SA. Tratamento das fissuras lábiopalatinas. Rio de Janeiro: Revinter; 1996.

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5. Rosenthal W. Erfahrungen auf dem Gebiete der Uranoplastik. Dtsch. Z. Chir. 1917;140(1-2):50-100. http://dx.doi.org/10.1007/BF02800937.

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7. Sarabahi S, Tiwari VK. Orbicularis oris musculomucosal flap for anterior palatal fistula. Indian Journal of Plastic Surgery. 2006;39(2):148. http://dx.doi.org/10.4103/0970-0358.29543.

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10. Henderson HP. The "tadpole flap": an advancement island flap for the closure of anterior palatal fistulae. Br J Plast Surg. 1982;35(2):163-6. http://dx.doi.org/10.1016/0007-1226(82)90156-4. PMid:7082891

11. Guerrero-Santos J, Altamirano JT. The use of lingual flaps in repair of fistulas of the hard palate. Plast Reconstr Surg. 1966;38(2):123-8. http://dx.doi.org/10.1097/00006534-196608000-00007. PMid:5913181

12. Nose K, Isshiki N, Sawada M, Taira T, Kusumoto K, Hiramoto M, et al. Palatal Fistula Repair - Methods and Results. Studia Phonologica XXIII. 1989.

13. Hochberg J. Retalhos. Rio de Janeiro: MEDSI; 1990.

14. Mélega JM, Zanini SA, Psillakis JM. Cirurgia plástica reparadora e estética. Rio de Janeiro: MEDSI; 1988.

15. Hirshowitz B, Mahler D. Two surgical procedures for closure of palatal fistulae. Cleft Palate J. 1970;7:685-9. PMid:5270520.










1. Especialista em Cirurgia Plástica, Coordenador do Núcleo de Cirurgia do Trauma Facial do Instituto Dr. José Frota (IJF), Staff do Serviço de Cirurgia Plástica do Hospital Geral de Fortaleza (HGF), Fortaleza, CE, Brasil
2. Membro Residente do Serviço de Cirurgia Plástica do Hospital Geral de Fortaleza (HGF), Fortaleza, CE, Brasil
3. Acadêmico de Medicina da Universidade Estadual do Ceará (UECE), Fortaleza, CE, Brasil

Instituição: Trabalho realizado no Hospital Geral de Fortaleza, Fortaleza, CE, Brasil.

Autor correspondente:
Afonso de Souza Ribeiro Filho
Rua Pe. Januário Campos, 68, casa 22 - Parque Manibura
Fortaleza, CE, Brasil CEP 60821-565
E-mail: afonsodesrf@hotmail.com

Artigo submetido: 20/06/2011.
Artigo aceito: 21/04/2012.

 

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