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Ideas and Innovation - Year2015 - Volume30 - Issue 1

http://www.dx.doi.org/10.5935/2177-1235.2015RBCP0124

RESUMO

INTRODUÇÃO: O Dermatofibrossarcoma do Ombro é patologia incomum e seu tratamento demanda extensas ressecções. O sistema escapular é fonte de retalhos bastante utilizados nesta região.
MÉTODO: Realizado estudo longitudinal, prospectivo, através da condução de um caso de Dermatofibrossarcoma Protuberans em ombro direito, submetido a ressecção e reconstrução local com Retalho Duoescapular, obtido através da associação dos retalhos escapular e paraescapular.
RESULTADOS: Paciente evoluiu sem intercorrências no pós-operatório, não sendo observadas complicações sistêmicas e locais, e limitações funcionais.
CONCLUSÃO: O Retalho Duoescapular é nova e relevante opção para reconstrução de feridas extensas, com exposição de estruturas nobres no ombro. Permite fechamento primário da área doadora, sem acrescentar morbidade ao procedimento.

Palavras-chave: Duoescapular; Escapular; Paraescapular; Dermatofibrossarcoma; Ombro; Retalho.

ABSTRACT

INTRODUCTION: Shoulder cutaneous fibrosarcoma is an unusual pathology that requires extensive resections. The scapula is a source of flaps widely used in this region.
METHOD: A longitudinal and prospective study was carried out in a patient with protuberans cutaneous fibrosarcoma on the right shoulder who underwent resection followed by local reconstruction with a Duoscapular Flap (a combination of scapular and parascapular flaps).
RESULTS: The patient had no postoperative complications, as systemic and local complications as well as functional limitations were not observed.
CONCLUSION: Duoscapular Flap placement is a novel procedure and a relevant choice for the reconstruction of extensive wounds exposing noble structures in the shoulder. It allows the primary closure of the donor area without increasing the morbidity of the procedure.

Keywords: Duoscapular; Scapular; Parascapular; Cutaneous fibrosarcoma; Shoulder; Flap.


INTRODUÇÃO

O ombro é sede comum de neoplasias, sendo a enxertia cutânea amplamente empregada. O acometimento desta região pelo Dermatofibrossarcoma protuberans é raro e seu tratamento se baseia em extensas ressecções, exigindo do cirurgião plástico grande perícia para sua recomposição. Os retalhos fasciocutâneos derivados do sistema escapular se mostram como boas opções para cobertura cutânea desta região1. Descrevemos uma forma inovadora de aplicação dos retalhos escapulares, o Retalho Duoescapular, originado da associação dos retalhos escapular e paraescapular, que foi aplicado no tratamento de Dermatofibrossarcoma em ombro.


MÉTODOS

O material para estudo baseou-se no acompanhamento e na condução do caso. Trata-se de um estudo longitudinal, prospectivo. Paciente foi informada e assinou o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). Não há conflito de interesses.

Descrição do caso

Paciente do sexo feminino, 46 anos, faioderma, sem comorbidades, com história de lesão nodular em ombro direito havia 20 anos. Biópsias realizadas no período evidenciavam quadro de Dermatofibroma. Evoluiu havia 2 anos com nodulação fibrosa sobre sítio cirúrgico prévio, de crescimento lento e gradual, dor progressiva, complicada por episódios de sangramento e drenagem de material necrótico. Nova biópsia confirmou diagnóstico de Dermatofibrossarcoma Protuberans.

Foi encaminhada ao Serviço de Cirurgia Plástica do Hospital das Clínicas da UFMG. Na ocasião, apresentava grande lesão nodular, fibrosa, pedunculada e ulcerada, em região posterior de ombro direito, medindo 10×9×9 cm, aparentemente não aderida a planos profundos. Havia drenagem intensa de material necrótico e sanguinolento (Figura 1).


Figura 1. Dermatofibrossarcoma. Notar degeneração necrótica central e aspecto pedunculado.



Tomografia Computadorizada de Tórax (Figura 2) revelou imagem nodular cutânea na região posterior do ombro direito, sem acometimento de planos musculares e ósseos. Ausência de adenomegalias e metástases à distância.


Figura 2. Tomografia de Tórax. Lesão não aderida a planos profundos.



Optou-se pela ressecção da lesão com margens de 4 cm (Figura 3), em que foi obtida peça em bloco (14×14×12 cm) contendo tecido subcutâneo, músculo trapézio e periósteo escapular, sem evidências macroscópicas de lesão residual.


Figura 3. Ferida no intraoperatório.



O Retalho Duoescapular foi utilizado para reconstrução local. Este é obtido através da associação dos retalhos escapular e paraescapular, formando um retalho bilobado, que proporciona cobertura cutânea adequada para a lesão (Figura 4), além de fechamento imediato da área doadora com mínima morbidade e ausência de sequelas.


Figura 4. Marcação das margens de segurança e do retalho escapular associado ao paraescapular.



O procedimento se inicia com a identificação do "espaço triangular", origem dos vasos escapulares. A partir deste ponto, traça-se uma linha horizontal em direção à coluna vertebral, sendo este o limite medial e o eixo do retalho escapular.

A borda lateral da escápula serve como referência para marcação de uma linha vertical descendente com até 25 cm de comprimento, representando o ramo descendente da artéria circunflexa da escápula, nutridora do retalho paraescapular (Figura 5).


Figura 5. Marcação dos eixos dos retalhos. Atentar para o espaço triangular.



Atenção especial deve ser conferida ao ponto de origem do ramo descendente da artéria circunflexa da escápula, que deve estar centralizado, servindo como eixo da porção descendente do retalho.

O descolamento principia-se pela ferida, no plano subfascial, liberando o retalho por completo, até que se obtenha fechamento da ferida sem nenhum grau de tensão, com perfeita coaptação das bordas (Figura 6).


Figura 6. Descolamento no plano subfascial.



Após revisão hemostática, realiza-se sutura por planos com fios absorvíveis de Vicryl 2.0 e 3.0, seguidos de Mononylon 3.0 para síntese cutânea. Posicionam-se drenos de aspiração a vácuo, que são retirados de acordo com sua drenagem (Figura 7).


Figura 7. Aspecto final do retalho.



RESULTADOS

Paciente evoluiu bem no pós-operatório, sem qualquer intercorrência, recebendo alta no terceiro dia de internação. No exame anatomopatológico, diagnosticou-se Dermatofibrossarcoma Protuberans, com margens cirúrgicas livres. Paciente foi encaminhada ao setor de Oncologia Clínica, que optou pela realização de terapia adjuvante através de radioterapia. No momento, paciente encontra-se em acompanhamento clínico, sem sinais de recidiva (Figura 8).


Figura 8. Pós-operatório de 40 dias.



DISCUSSÃO

O Dermatofibrossarcoma Protuberans é neoplasia maligna rara, derivada de dendrócitos dérmicos, de comportamento altamente recidivante2. Seus sítios preferenciais são tronco e região proximal dos membros. Costuma ser confundido inicialmente com cicatriz hipertrófica ou queloide3.

O tratamento é baseado na ressecção com amplas margens cirúrgicas (3 a 5 cm), com ressecção da fáscia profunda ou primeira estrutura íntegra encontrada3. Exérese cirúrgica com margens de 2,5 cm mostram-se livres em 95% dos casos2.

O retalho escapular é retalho fasciocutâneo do tipo B, com pedículo vascular baseado nos vasos circunflexos da escápula. Localiza-se na porção posterior do tronco, entre a axila e a linha média posterior, centrado sobre a região infraespinhosa da escápula4.

Possui dimensões de até 20×7 cm, podendo ser orientado vertical ou horizontalmente. Apresenta anatomia constante e confiável de seu pedículo vascular, fácil dissecção cirúrgica e possibilidade de fechamento primário da área doadora4.

Seu pedículo origina-se no chamado "espaço triangular" (Figura 9), compreendido entre os músculos subescapular e redondo menor, superiormente; redondo maior, inferiormente, e tríceps, lateralmente4.


Figura 9. Retalho Escapular.



Os ramos cutâneos entre o terceiro e o quinto espaços intercostais são responsáveis por sua inervação5.

O retalho paraescapular foi descrito por Nassif et al. em 1982, através da detecção da presença constante de um ramo descendente derivado da artéria circunflexa escapular6. Este pedículo, responsável por sua irrigação, possui trajeto vertical, originando-se próximo à margem lateral da escapula 7.

Pode se estender inferiormente por até 25 cm, com largura média de 7 cm (Figura 10). É retalho fasciocutâneo do Tipo B de Cormack e Lamberty7.


Figura 10. Retalho Paraescapular.



Devido à sua conformação, não há ramos nervosos específicos para este retalho1.

Ambos os retalhos são indicados para reconstruções de defeitos em ombro, cotovelo, axila e região lateral da parede torácica. São também utilizados como retalhos microcirúrgicos1.

Os retalhos de perfurantes da artéria toracodorsal são alternativas interessantes e bastante utilizados nas reconstruções do ombro1,8. No entanto, estes apresentam derme e tecido subcutâneo mais delgados que o retalho escapular, e pedículo com maior variação de emergência; localizam-se lateralmente, tornando mais árdua a sua rotação para o ombro5.

Devido a grande profundidade e exposição óssea escapular na lesão resultante, optou-se pelo uso de retalho fasciocutâneo. Resguardaram-se os retalhos musculares para uma eventual recidiva.

Objetivou-se, com o uso do retalho, a reconstrução adequada da área lesada e o fechamento imediato da área doadora, com o mínimo de complicações e sequelas.

A associação dos princípios de irrigação dos retalhos escapular e paraescapular permitiu a confecção de um retalho bilobado, robusto e com excelente vitalidade. O formato bilobado propicia a confecção de retalho com grandes dimensões e com adequada cobertura da lesão, além de permitir fechamento primário da área doadora. Não se observaram deiscências, isquemia, infecções e limitações funcionais.


CONCLUSÃO

O Dermatofibrossarcoma Protuberans do ombro é patologia maligna rara, localmente infiltrativo e altamente recidivante. Seu tratamento deve ser agressivo, baseado em amplas ressecções, que demandam reconstruções complexas.

O Retalho Duoescapular mostrou-se confiável e eficaz na cobertura de larga e profunda lesão no ombro. Possibilitou fechamento primário da área doadora, com melhor resultado estético que a enxertia, sem acrescentar morbidade e incapacidade funcional à paciente.

É uma nova e relevante opção para reconstrução de feridas extensas, com exposição de estruturas nobres no ombro.


REFERÊNCIAS

1. Chang J, Neligan PC. Plastic surgery. 3rd ed. Elsevier Health Sciences; 2012. (Hand and Upper Limb, vol. 6).

2. Mélega JM. Cirurgia plástica fundamentos e arte. Rio de Janeiro: Medsi; 2004.

3. Fleury LFF JR, Sanches JA JR. Sarcomas cutâneos primários. An Bras Dermatol. 2006;81(3):207-21. http://dx.doi.org/10.1590/S0365-05962006000300002.

4. Sevin K. Review of the free scapular flap: a versatile flap for most osteocutaneous tissue defects. Eur J Plast Surg. 2001;24(6):282-8. http://dx.doi.org/10.1007/s002380100296.

5. Ishida LH. Estudo anatômico comparativo entre o retalho escapular e o retalho perfurante da artéria toracodorsal [dissertação]. São Paulo: Faculdade de Medicina da USP; 2006.

6. Nassif TMMD, Vidal L, Bovet JLMD, Baudet J. The parascapular flap: a new cutaneous microsurgical free flap. Plast Reconstr Surg. 1982;69(4):591-600. http://dx.doi.org/10.1097/00006534-198204000-00001. PMid:7071197.

7. Klinkenberg M, Fischer S, Kremer T, Hernekamp F, Lehnhardt M, Daigeler A. Comparison of anterolateral thigh, lateral arm, and parascapular free flaps with regard to donor-site morbidity and aesthetic and functional outcomes. Plast Reconstr Surg. 2013;131(2):293-302. http://dx.doi.org/10.1097/PRS.0b013e31827786bc. PMid:23357991.

8. Thomas BP, Geddes CR, Tang M, Williams J, Morris SF. The vascular basis of the thoracodorsal artery perforator flap. Plast Reconstr Surg. 2005;116(3):818-22. http://dx.doi.org/10.1097/01.prs.0000176253.42394.7c. PMid:16141821.










1. Hospital das Clínicas, Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Belo Horizonte, MG, Brasil
2. Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Belo Horizonte, MG, Brasil

Instituição: Trabalho realizado no Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, MG, Brasil.

Autor correspondente:
Diogo Petroni Caiado Fleury
Universidade Federal de Minas Gerais
Av. Professor Alfredo Balena, 110 - Santa Efigênia
Belo Horizonte, MG, Brasil CEP 30130-100
E-mail: diogocaiadomed@gmail.com

Artigo submetido: 3/5/2013.
Artigo aceito: 18/9/2013.

 

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