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Case Report - Year2023 - Volume38 - Issue 1

http://www.dx.doi.org/10.5935/2177-1235.2023RBCP0736-PT

RESUMO

Introdução: A mamoplastia de aumento é uma das cirurgias mais frequentemente realizadas na cirurgia plástica. Entre suas intercorrências mais raras, está a galactorreia, saída de leite pela papila de forma espontânea, e o galactocele, uma coleção de material leitoso no leito cirúrgico. Pouca literatura existe sobre esta raríssima intercorrência e por meio deste artigo realizamos uma revisão da literatura e relato de um caso operado no nosso serviço.
Relato de Caso: Apresentamos um caso de uma paciente de 35 anos que foi submetida a cirurgia de mamoplastia de aumento via sulco inframamário, com implante alocado no plano subglandular, que evoluiu, no trigésimo dia pós-operatório, com galactorreia exteriorizada pela incisão, e propomos um tratamento para tal intercorrência. Com seis meses de pós-operatório, as mamas se encontravam simétricas, sem sinais de contratura ou alterações adicionais, paciente satisfeita com o resultado e sem novos episódios de galactorreia ou galactocele.
Conclusão: Embora rara, com uma incidência de menos de 1%, a galactorreia pode ocorrer como intercorrência pós- operatória e o conhecimento desta, bem como as formas de tratamento, irá beneficiar tanto paciente como cirurgião.

Palavras-chave: Galactorreia; Implante mamário; Mamoplastia; Doenças mamárias; Procedimentos cirúrgicos reconstrutivos; Relatos de casos

ABSTRACT

Introduction: Augmentation mammoplasty is one of the most frequently performed surgeries in plastic surgery. Among its rarer occurrences are galactorrhea, spontaneous milk output by the papilla, and galactocele, a collection of milky material in the surgical bed. There is little literature on this extremely rare occurrence, and through this article, we conduct a literature review and report on a case operated in our service.
Case Report: We present a case of a 35-year-old patient who underwent breast augmentation surgery via the inframammary fold, with an implant placed in the subglandular plane, which evolved, on the thirtieth postoperative day, with galactorrhea exteriorized through the incision, and we propose a treatment for such intercurrence. Six months after the operation, the breasts were symmetrical, without signs of contracture or additional alterations; the patient was satisfied with the result and without new episodes of galactorrhea or galactocele.
Conclusion: Although rare, with an incidence of less than 1%, galactorrhea can occur as a postoperative complication, and knowledge about it, as well as the forms of treatment, will benefit both patient and surgeon.

Keywords: Galactorrhea; Breast implantation; Mammaplasty; Breast diseases; Reconstructive surgical procedures; Case reports


INTRODUÇÃO

A mamoplastia de aumento com uso de implantes é um procedimento realizado com alta frequência no mundo. Somente no ano de 2020, foram 1.624.281 cirurgias realizadas, segundo a International Society of Aesthetic Plastic Surgery (ISAPS)1. Embora muito seguro, não está isento de complicações. Algumas dessas complicações são bem conhecidas, como hematoma, seroma, contratura capsular, infecção, cicatriz inestética e mau posicionamento dos implantes, e algumas são incomuns, como a galactorreia2,3.

A galactorreia e a galactocele podem acontecer em até 0,96% das pacientes submetidas a mamoplastia de aumento com implantes. Em média levam um período de 15-90 dias para se manifestar. A galactocele foi definida como acúmulo de leite na loja cirúrgica, podendo este conteúdo ser drenado de maneira espontânea através da ferida operatória4. Já a galactorreia é definida como excreção espontânea de leite pela papila, sem estímulo de sucção3.

A causa da galactorreia e galactocele no pósoperatório ainda não foi completamente elucidada. Acredita-se que o gatilho possa se dar pelo aumento na prolactina devido ao estímulo cirúrgico ou pela compressão nervosa do gradil costal. Também há teorias que apontam que a compressão mecânica dos implantes sobre a glândula ou até efeito de outros medicamentos tomados pela paciente podem ser os responsáveis por tal intercorrência5.

O tratamento se baseia em inibidores da prolactina como bromocriptina4,6,7 e pode estar associado a drenagem cirúrgica da galactocele de forma percutânea ou aberta7. Por ser uma intercorrência rara, com a qual o cirurgião pode se deparar algum dia, apresentamos um caso vivenciado em nosso serviço, bem como o esquema de tratamento utilizado e o seguimento pós-operatório com 10 meses de cirurgia.

OBJETIVO

Apresentar um caso de galactocele em uma paciente que foi submetida a mamoplastia de aumento com implantes, relatar a condução do caso, tratamento aplicado e resultados.

RELATO DE CASO

Relatamos o caso de uma paciente do sexo feminino, de 35 anos, com queixa de mamas hipoplásicas e desejo de aumento mamário (Figuras 1A e 1B), internada Hospital Irmãos Penteado, Serviço de Cirurgia Plástica Dr. Ricardo Barouldi, em Campinas, S P. Apresentava duas gestações prévias e amamentação cessada há um ano da cirurgia. Paciente apresentava tendência à formação de cicatriz queloide, sem outros antecedentes importantes. Em 09 de outubro de 2020 foi realizada a cirurgia de mamoplastia de aumento utilizando implantes texturizados de 300ml no plano subglandular e por via de acesso no sulco inframamário. O pós-operatório ocorreu sem intercorrências e a paciente evoluiu adequadamente.

Figura 1. A - Paciente no pré-operatório (vista frontal). B: Paciente no pré-operatório (vista lateral).

Trinta dias após o procedimento cirúrgico, apresenta secreção de aspecto leitoso (Figura 2) drenando espontaneamente pela ferida operatória, sem dor, febre ou outros sintomas, além de galactorreia bilateral. Foi utilizada cabergolina 0,5mg de 12h/12h associada a cefadroxila 500mg de 12h/12h por 48h. Este esquema de pulsos de cabergolina foi repetido com 45 dias após o procedimento cirúrgico. Com esta conduta, a paciente apresentou diminuição progressiva da quantidade de secreção drenada pela ferida operatória, cessando totalmente com 60 dias de pós-operatório.

Figura 2 - Drenagem espontânea pela ferida operatória de secreção de aspecto leitoso.

A paciente evoluiu com cicatriz hipertrófica na região do sulco inframamário, que foi tratada com quatro sessões de infiltração intracicatricial de acetato de triancinolona. Com seis meses de pós-operatório (Figuras 3A e 3B), as mamas se encontram simétricas, sem sinais de contratura ou alterações adicionais, paciente satisfeita com o resultado e sem novos episódios de galactorreia ou galactocele.

Figura 3. A - Pós-operatório com seis meses (vista frontal). B: Pós-operatório com seis meses (vista lateral).

DISCUSSÃO

A galactorreia é uma intercorrência rara que ocorre nas cirurgias de aumento mamário. Foi primeiramente descrita em 1971 e é definida como a saída espontânea de leite não associada à amamentação6,7. Inicialmente, pode se confundir com infecção ou abscesso mamário por conta do edema, da dor e aspecto da secreção8. Entre as causas de galactorreia, podemos destacar estímulo do mamilo, gestação, uso de medicações que aumentam a produção de prolactina, hiperprolactinemia iatrogênica acima de 27ng/ml, alterações tireoideanas, alterações renais e prolactinomas9.

Dentre as causas de galactorreia pós-operatória de mamoplastia de aumento, tem sido sugerido o aumento da prolactina em resposta às células lactotróficas da pituitária anterior, o que leva à produção de leite; a prolactina pode se elevar em até 5 vezes decorrente do estímulo cirúrgico9. Outra teoria indica que a irritação dos nervos costais pela cirurgia leva a uma supressão do eixo hipotalâmico, com diminuição da liberação da dopamina4. Porém, na revisão sistemática publicada por Sharma & Basu4 foi encontrado que nem todas as pacientes apresentavam níveis elevados de prolactina no período pós-operatório.

Podemos apontar alguns fatores de risco que estão associados com a galactorreia, como última gestação próxima ao período da cirurgia, maior número de gestações, lactação prévia e uso de medicação anticonceptiva.

Sobre o plano de inserção do implante, os alocados em posição subglandular e incisão periareolar estão mais relacionados com a galactorreia4. Segundo Chun & Taghinia10, isto é decorrente da obstrução de alguns ductos galactóforos da mama. O início de sintomas é citado em média de 15 dias, podendo se manifestar após 90 dias de pós-operatório3,6.

Alguns exames podem ser rotineiramente empregados, como dosagem dos níveis séricos de prolactina, Beta-HCG, hemograma, proteína C reativa, provas tireóideas e prova de Sudan IV para determinação de leite6,7,11. Em relação aos exames de imagem, ultrassonografia, culturas da secreção, ressonância magnética da pituitária em caso de hiperprolactinemia acima de 100ng/ml4 podem ser necessários para confirmação diagnóstica.

Após confirmação do quadro, devemos prosseguir com o tratamento medicamentoso. Autores propõem abordagens distintas, que incluem o uso de bromocriptina na dose 2,5mg duas vezes ao dia como primeira linha e cabergolina 0,5mg 1-2 cp por semana e como segunda linha2,4,11. Também pode ser incluído tratamento com antibiótico por risco de infecção associado ao implante4,11, inibidores de dopamina, inibidores dos leucotrienos, a fim de evitar chance de contratura capsular6, e explante com lavagem de loja4,6,11.

Na revisão da literatura encontramos que a maioria dos estudos publicados são relatos de casos similares com este: duas séries de caso e uma revisão sistemática.

Acreditamos que ampliar o número de estudos sobre este tópico será importante para unificar condutas e minimizar esta intercorrência.

CONCLUSÃO

A galactorreia e galactocele são intercorrências raras da mamoplastia de aumento. Com um diagnóstico adequado e um tratamento precoce conseguimos tratála sem modificar o resultado das nossas cirurgias. Mais investigações precisam ser realizadas a respeito desta intercorrência rara a fim de unificar condutas e minimizar complicações.

REFERÊNCIAS

1. International Society of Aesthetic Plastic Surgery (ISAPS). Pesquisa global de 2020 da ISAPS observa mudanças significativas nos procedimentos estéticos durante a pandemia. West Lebanon: ISAPS; 2021.

2. Ayestaray B, Dudrap E, Chaibi A. Galactorrhea after aesthetic breast augmentation with silicone implants: report of two cases and management of postoperative galactorrhea. Aesthetic Plast Surg. 2011;35(3):408-13.

3. Basile F V, Basile AR. Diagnosis and management of galactorrhea after breast augmentation. Plast Reconstr Surg. 2015;135(5):1349-56.

4. Sharma SC, Basu NN. Galactorrhea/Galactocele After Breast Augmentation: A Systematic Review. Ann Plast Surg. 2021;86(1):115-20.

5. Schusterman MA 2nd, Bruce MK, Nicholas K, Diego E, La Cruz C. Galactorrhea After Nipple-Sparing Mastectomy: Case Report, Review of the Literature, and Algorithmic Approach to Management. Ann Plast Surg. 2022;88(4):467-9.

6. Batista KT, Monteiro GB, Y-Schwartzman U P, Roberti AFSSA, Rosa AG, Correia CZ, et al. Treatment of leprosy-induced plantar ulcers. Rev Bras Cir Plást. 2019;34(4):497-503.

7. Viaro MSS, Viaro PS, Batistti C. Galactocele due to drugs prescribed after augmentation mammoplasty: a case report and literature review. Rev Bras Cir Plást. 2016;31(2):287-91.

8. Guerra M, Codolini L, Cavalieri E, Redi U, Ribuffo D. Galactocele After Aesthetic Breast Augmentation with Silicone Implants: An Uncommon Presentation. Aesthetic Plast Surg. 2019;43(2):366-9.

9. Macedo JLS, Rosa SC, Naves LA, Motta LACR. Galactorrhea after augmentation mastoplasty. Rev Bras Cir Plást. 2017;32(1):155-6.

10. Chun YS, Taghinia A. Hyperprolactinemia and galactocele formation after augmentation mammoplasty. Ann Plast Surg. 2009;62(2):122-3.

11. Ascenço ASK, Graf R, Maluf Junior I, Balbinot P, Freitas RS. Galactorrhea: how to address this unusual complication after augmentation mammoplasty. Rev Bras Cir Plást. 2016;31(2): 143-7.











1. Hospital Irmãos Penteado, Serviço de Cirurgia Plástica Dr Ricardo Barouldi, Campinas, São Paulo, Brasil

Autor correspondente: Raphaela Silveira do Amaral Av. José Bonifácio, 2001, Campinas, S P, Brasil. CEP: 13092-305 E-mail: rapha_samaral@hotmail.com

Artigo submetido: 21/06/2022.
Artigo aceito: 16/11/2022.

Conflitos de interesse: não há.

 

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