ISSN Online: 2177-1235 | ISSN Print: 1983-5175

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Original Article - Year2011 - Volume26 - Issue 3

RESUMO

Introdução: As deformidades auriculares congênitas ou traumáticas representam um tema de expressividade e complexidade em cirurgia plástica, pelo aumento de casos e pelo alto grau de dificuldade observado nos procedimentos de reparação, necessários para a restauração da harmonia facial do indivíduo. Os autores avaliam a técnica utilizada nas reconstruções auriculares e suas complicações, bem como o grau de satisfação estética e funcional. Método: Foi realizado um estudo retrospectivo, transversal, analisando os casos de reconstrução de orelha pós-trauma, operados no Hospital Geral de Goiânia Dr. Alberto Rassi e em clínica particular, de fevereiro de 2005 a março de 2010, em que foi empregado enxerto de cartilagem costal. O grau de satisfação dos pacientes foi aferido nas consultas de pós-operatório com relação aos aspectos estéticos e funcionais. Resultados: Foram analisados 34 casos, sendo 14 (41,1%) mulheres e 20 (58,9%) homens, com faixa etária entre 13 e 56 anos. O tempo médio para a reconstrução após o trauma foi de cerca de seis meses a oito meses e de um ato cirúrgico para outro, de seis meses. Cinco pacientes apresentaram complicações, e apenas um deles necessitou reintervenção em decorrência de retração auricular posterior. Do total de pacientes avaliados, 30 se definiram como satisfeitos com o resultado tanto estético como funcional e os outros 4, como insatisfeitos, sendo um deles submetido a retoque posterior. Conclusões: A reconstrução auricular após trauma é um tema complexo da cirurgia plástica, mas com a padronização e a sistematização de técnicas e uma curva de aprendizagem bem executada os resultados são muito satisfatórios, devolvendo harmonia facial ao indivíduo, com baixa taxa de complicações.

Palavras-chave: Orelha/cirurgia. Orelha externa/cirurgia. Cartilagem/transplante. Cirurgia plás­tica/métodos.

ABSTRACT

Background: Congenital or traumatic ear deformities are difficult and complex issues in plastic surgery due to the increasing number of cases and high degree of difficulty involved in surgeries to restore facial harmony. The authors assessed the techniques used in ear reconstruction, their complications, and the degree of esthetic and functional satisfaction. Methods: A retrospective cross-sectional study was performed, including cases of post-traumatic ear reconstruction in which costal cartilage graft was employed; the study took place at Hospital Geral de Goiânia Dr. Alberto Rassi and a private clinic from February 2005 to March 2010. Patient satisfaction with respect to esthetic and functional aspects was recorded during postoperative visits. Results: Thirty-four cases were analyzed including 14 (41.1%) women and 20 (58.9%) men (range, 13-56 years). The average time for reconstruction after trauma was 6-8 months, and the average interval between surgeries was 6 months. Five patients had complications; only 1 required re-intervention due to posterior atrial contraction. Of all patients, 30 reported being satisfied with both the esthetic and functional results; 4 were dissatisfied, and 1 of them underwent subsequent retouching. Conclusions: Ear reconstruction after trauma is a complex issue in plastic surgery; however, with the standardization and systematization of techniques and a well-established learning curve, the results are very satisfactory; facial harmony can be restored with low complication rates.

Keywords: Ear/surgery. Ear, external/surgery. Cartilage/transplantation. Plastic surgery/methods.


INTRODUÇÃO

As deformidades auriculares podem ser congênitas ou traumáticas, estas em decorrência de queimaduras, acidentes, mordidas e amputação por elementos cortantes1.

Nas lesões pós-traumáticas deve-se, primeiramente, garantir a integridade geral do paciente e minimizar os danos e a possibilidade de complicações no local da perda auricular. A reutilização de cartilagem lesada é assunto controverso, optando-se, na maioria das vezes, por desprezar o tecido amputado e proceder à reconstrução com cartilagem costal ou da orelha contralateral, dependendo da extensão da lesão, após a recuperação das condições clínicas do paciente e a cicatrização do local do ferimento (em média seis meses após o acidente).

A reconstrução auricular é um dos temas mais desafiadores da cirurgia plástica. Desde os trabalhos de Converse2 e Tanzer3, passando por publicações de Avelar4, Brent5 e Nagata6, entre outras, pode-se verificar a complexidade das cirurgias reparadoras, imprescindíveis ao equilíbrio tanto estético como funcional do indivíduo.

Este trabalho teve como objetivo avaliar os pacientes submetidos a reconstrução de orelha pós-trauma no Hospital Geral de Goiânia Dr. Alberto Rassi e em clínica particular quanto à técnica utilizada e suas complicações e quanto ao grau de satisfação estética e funcional.


MÉTODO

Foram analisados os casos de reconstrução de orelha pós-trauma operados no Hospital Geral de Goiânia Dr. Alberto Rassi e em clínica particular, de fevereiro de 2005 a março de 2010, com perda de cartilagem auricular sem a possibilidade de utilização da orelha contralateral para retirada de enxerto. Foi empregada preferencialmente a cartilagem costal. Todos os casos de lesões traumáticas operados no intervalo citado foram incluídos no trabalho, sem critérios de exclusão. Outros 16 pacientes submetidos a reconstruções auriculares em decorrência de malformações congênitas não entraram na casuística deste trabalho e serão incluídos em outro levantamento científico, em decorrência de suas particularidades.

O grau de satisfação dos pacientes foi aferido nas consultas pós-operatórias com relação aos aspectos estéticos e funcionais.


RESULTADOS

Foram analisados 34 pacientes, sendo 14 (41,1%) mulheres e 20 (58,9%) homens, com média de idade de 33,2 anos, variando entre 13 e 56 anos (Figuras 1 a 3). Uma paciente foi submetida a reconstrução simultânea das duas orelhas, utilizando apenas um arco de cartilagem costal (Figuras 4 a 9).


Figura 1 - Pré e pós-operatório de reconstrução de polo superior de orelha direita após lesão traumática.


Figura 2 - Pré e pós-operatório de reconstrução de orelha esquerda após lesão traumática associada a queimadura.


Figura 3 - Resultado final após liberação de polo superior e uso de modelador retroauricular por seis meses.


Figura 4 - Pré-operatório de paciente apresentando perda traumática de orelha esquerda.


Figura 5 - Pré-operatório de paciente apresentando perda traumática de orelha direita.


Figura 6 - Cartilagem costal bipartida para reconstrução das duas orelhas.


Figura 7 - Cartilagem costal bipartida e moldada para reconstrução simultânea das duas orelhas.


Figura 8 - Pós-operatório de reconstrução de orelha esquerda.


Figura 9 - Pós-operatório de reconstrução de orelha direita.



O tempo médio para a reconstrução após o trauma foi de cerca de seis meses a oito meses e de um ato cirúrgico para outro, de seis meses.

A técnica padrão utilizada copiava o formato da orelha contralateral com filme de radiografia invertido, reconstruindo a orelha com cartilagem retirada do oitavo ou do nono arco costal homolateral (Figuras 10 a 12). As áreas tanto doadora como receptora de cartilagem foram submetidas a drenagem a vácuo. No segundo tempo cirúrgico, foi colocado enxerto de pele total retirado da região inguinal e utilizado modelador retroauricular (desenvolvido pelo primeiro autor, JCS), quando houve necessidade, por seis meses, para evitar a retração cicatricial nos casos de reconstruções após grandes perdas cartilaginosas. Esse modelador é feito de esponja Plastazote de 12 mm com velcro (Figuras 13 e 14).


Figura 10 - Intraoperatório: retirada de cartilagem costal e molde de filme de radiografia para marcação do tamanho do enxerto necessário à reconstrução.


Figura 11 - Intraoperatório: cartilagem moldada e fixada ao leito receptor.


Figura 12 - Pós-operatório imediato com retalho retroauricular cobrindo o enxerto.


Figura 13 - Modelador retroauricular utilizado por paciente submetido a reconstrução de polo superior de orelha direita.


Figura 14 - Paciente em uso do modelador retroauricular.


Dentre as complicações observadas, destacam-se um (0,3%) caso de hematoma, um (0,3%) caso de grande absorção do enxerto cartilaginoso, um (0,3%) caso de infecção com exposição da cartilagem (tratamento com curativo e antibiótico), e dois (0,6%) casos de retração cicatricial auricular posterior após a elevação do enxerto, com necessidade de intervenção cirúrgica em um deles, o que levou ao desenvolvimento do modelador retroauricular.

Nas consultas de pós-operatório, 30 pacientes se definiram como satisfeitos com o resultado tanto estético como funcional e 4 indivíduos, como insatisfeitos, sendo um deles submetido a retoque posterior.


DISCUSSÃO

A procura por cirurgia plástica reparadora auricular tem aumentado no decorrer dos anos, pela maior ocorrência de lesões traumáticas em consequência de acidentes de trânsito e de violência interpessoal.

As reconstruções auriculares apresentam acentuado grau de dificuldade e longa curva de aprendizado. Desde os primórdios de tentativas de reconstrução até o desenvolvimento das técnicas atuais, que começaram a ser padronizadas por Tanzer3, em 1959, os resultados são muito variáveis em decorrência de diversos fatores, sendo o principal deles a experiência do cirurgião. Outro fator muito importante é a idade do paciente, influenciando na qualidade da cartilagem costal, já que pacientes com menos de 13 anos de idade possuem cartilagens muito pequenas e pacientes com mais de 50 anos de idade apresentam maior grau de calcificação e absorção cartilaginosa pós-operatória, associado a grande dificuldade para modelar o enxerto em decorrência de sua rigidez.

Observa-se predominância de reconstruções auriculares em homens adultos jovens, principalmente pela maior exposição a trabalhos braçais e a violência de trânsito e interpessoal.

Os pacientes incluídos neste estudo foram submetidos a reconstruções com utilização de cartilagem costal, o que garante um resultado mais previsível e com menor retração cicatricial.

O período entre o primeiro e o segundo tempos cirúrgicos deve ser de, em média, seis meses. O uso do modelador retroauricular constitui um grande auxílio para evitar a retração cicatricial após a elevação da nova orelha.


CONCLUSÃO

A reconstrução auricular após trauma é um tema complexo da cirurgia plástica, mas com a padronização e a sistematização de técnicas e uma curva de aprendizagem bem executada os resultados são muito satisfatórios, devolvendo harmonia facial ao indivíduo, com baixa taxa de complicações.


REFERÊNCIAS

1. Carreirão S, Cardim V, Goldenberg D. Cirurgia plástica. São Paulo: Atheneu; 2005.

2. Converse JM. Reconstruction of the auricle. Plast Reconstr Surg. 1958;22(2):150-63.

3. Tanzer RC. Total reconstruction of the auricle. The evolution of a plan of treatment. Plast Reconstr Surg. 1971;47(6):523-33.

4. Avelar JM. Reconstrução total do pavilhão auricular num único tempo cirúrgico. Rev Bras Cir. 1977;67:139-46.

5. Brent B. Reconstruction of traumatic ear deformities. Clin Plast Surg. 1978;5(3):437-45.

6. Nagata S. A new method of total reconstruction of the auricle for microtia. Plast Reconstr Surg. 1993;92(2):187-201.










1. Membro titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP), ex-presidente da Regional de Goiás da SBCP, ex-membro da Comissão de Especialista da SBCP, regente do Serviço Credenciado da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica do Hospital Geral de Goiânia Dr. Alberto Rassi, Goiânia, GO, Brasil.
2. Médico residente do Serviço de Cirurgia Plástica do Hospital Geral de Goiânia Dr. Alberto Rassi, Goiânia, GO, Brasil.

Correspondência para:
José Carlos da Silva
Rua 15, 1.370 - Setor Marista
Goiânia, GO, Brasil - CEP 74150-020
E-mail: jcs.cirurgiaplastica@gmail.com

Artigo submetido pelo SGP (Sistema de Gestão de Publicações) da RBCP.
Artigo recebido: 9/11/2010
Artigo aceito: 5/2/2011

Trabalho realizado no Hospital Geral de Goiânia Dr. Alberto Rassi, Goiânia, GO, Brasil.

 

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